SAÚDE MENTAL

Especialistas apontam falta de políticas públicas para conter o vício em apostas

Profissionais de saúde cobraram ampliação da rede de saúde mental do Município e campanhas de conscientização

terça-feira, 26 Agosto, 2025 - 14:30
parlamentares e participantes presentes em audiência pública na câmara municipal de bh

Foto: Tatiana Francisca/CMBH

Em audiência pública realizada pela Comissão de Saúde e Saneamento na manhã desta terça-feira (26/8), gestores públicos, profissionais da saúde e representantes da sociedade civil organizada destacaram a falta de políticas públicas de prevenção e tratamento do vício em apostas. Considerando o aumento no número de diagnósticos de depressão e ansiedade, além de maior índice de endividamento, a reunião solicitada por Edmar Branco (PCdoB) e outros cinco parlamentares buscou discutir propostas de solução para a questão. Entre as sugestões apresentadas pelos especialistas presentes está o desenvolvimento de uma campanha de conscientização e de estratégias de fortalecimento da rede de saúde mental do Município, para ampliação dos atendimentos.

Impactos na cidade

Além de Edmar Branco, também assinam o requerimento que deu origem ao debate Flávia Borja (DC), Iza Lourença (Psol), Juhlia Santos (Psol), Luiza Dulci (PT) e Wagner Ferreira (PV), que destacou a importância da reunião para se construir "soluções para Belo Horizonte". Segundo o parlamentar, não se pode responsabilizar apenas o poder público federal, sendo fundamental pensar o que pode ser feito no Município. “Não é tudo com Brasília. Às vezes a gente tem a mania de ficar terceirizando para o poder público federal porque parece mais simples do que a gente encarar o problema; mas os impactos são aqui na cidade. O problema está aqui colocado, a gente precisa se responsabilizar”, declarou Wagner Ferreira.

O vereador esclareceu ainda que o encontro desta terça-feira foi o primeiro de uma série de audiências públicas que o Legislativo Municipal pretende fazer para discutir o impacto das apostas online. O parlamentar declarou que o intuito é ouvir, em outras oportunidades, “os clubes de futebol, as próprias bets e os familiares de pessoas afetadas”.

Diagnóstico e acolhimento

Gestores públicos da área e profissionais ligados à saúde mental relataram o crescimento de diagnósticos de ludopatia - que é o transtorno comportamental caracterizado pela compulsão em apostar, além de depressão e ansiedade provocados pelo vício em jogos de aposta, conhecidos como “bets”. Gerente-adjunta da Rede de Saúde Mental da PBH, Diana Amarante afirmou que hoje não se consegue ter os dados específicos do diagnóstico de ludopatia porque as pessoas em situação de dependência acessam o serviço a partir de outros transtornos, como ansiedade generalizada, quadros depressivos e tentativas de suicídio. Dessa forma, segundo Diana, é necessária a criação de protocolos de atendimentos específicos, porque cada sujeito adoecerá de formas diferentes.

“Esse diagnóstico da ludopatia se apresenta de forma secundária. O que aparece principalmente são quadros de depressão e ansiedade. O que a gente vê como saída não seria somente ter um centro de atenção especializada voltado à ludopatia. Hoje, a rede de saúde mental da prefeitura oferece um acolhimento abrangente. A gente trata o sofrimento de cada sujeito de forma única, considerando todo o contexto onde ele está envolvido. O que a gente vê é uma necessidade de regulamentação”, declarou Diana.

A gestora relatou também a chegada de "muitos casos" de desestrutura familiar provocada por quadros de ludopatia, que geram “um efeito de cascata". "Adoece não só o sujeito, mas todo o contexto social e familiar onde ele está envolvido”, declarou Diana Amarante.

Diálogo ampliado

Psicóloga do Centro de Referência em Saúde Mental (Cersam), Thaís Nascimento afirmou que os profissionais de saúde das unidades têm sido orientados para que estejam "mais atentos" a essas demandas, que chegam na forma de ansiedade, isolamento em relação à família e amigos, vergonha e culpa. Para a psicóloga, a questão de combate ao vício em bets deve ser tratada de "forma ampla", levando em conta os "atravessamentos sociais".

“A gente fala em determinantes sociais em saúde. Então a gente precisa pensar a comunicação com os jovens, como isso está aparecendo na publicidade, na propaganda. Está sendo estimulado sem uma regulamentação. Saúde é tudo isso. Temos a possibilidade de intervir com escuta, com medicação, com grupos de suporte, mas também de olhar para outras questões, para que a nossa resposta seja mais robusta”, declarou Thaís.

A psicóloga destacou a necessidade de se desenvolver campanhas de conscientização e pensar em políticas de assistência. “Precisamos pensar em uma educação crítica, pensar como isso está sendo conduzido nas escolas. Esse é um problema complexo e a gente não pode pensar em soluções simples, precisa vir por várias vias”, reforçou Thaís Nascimento.

Atuação do poder público

Presidente da Rede Abraço de Belo Horizonte, Gladstone dos Anjos cobrou uma atuação "mais firme" do poder público que, segundo ele, vem agindo de forma "tímida" sobre a questão. “Hoje temos cerca de 52 milhões de brasileiros jogando, isso não é brincadeira”, afirmou. Para Gladstone, mais do que regulamentar, é preciso penalizar as operadoras. “As contrapartidas dessas empresas têm que vir para o público, para quem está na ponta, quem é prejudicado”, defendeu o presidente da Abraço.

Gladstone destacou ainda um dos projetos desenvolvidos pela Rede Abraço, o grupo de conversa "Jogadores Anônimos". Segundo ele, no início, as reuniões contavam com cerca de 140 pessoas. Hoje, quase 500 pessoas são atendidas mensalmente, sendo o grupo que mais cresce no projeto. Para Gladstone, uma alternativa para a questão seria o estabelecimento de convênios com o poder público, possibilitando que associações como a Rede Abraço ampliem o acolhimento prestado.

Fortalecimento da rede de saúde mental

Além de outras audiências públicas para debater o combate ao vício em jogos de aposta, Wagner Ferreira destacou que outras secretarias municipais já foram acionadas por meio de pedidos de informação para que a questão seja tratada de "forma ampla". O parlamentar também afirmou que as sugestões serão estudadas, sobretudo em relação ao fortalecimento da rede de saúde mental do Município, a fim de que ela alcance um número maior de pessoas. Wagner Ferreira também defendeu o desenvolvimento de uma campanha de conscientização que envolva a CMBH, a prefeitura e a sociedade civil organizada.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater temas relacionados a saúde mental, a ludopatia e o combate ao vício em apostas on-line, notadamente Bets. 8ª Reunião Extraordinária - Comissão de Saúde e Saneamento.