ENSINO SUPERIOR

Excesso de aulas online e mensalidades caras foram denunciados por alunos

Carga horária inadequada, falta de aulas práticas e grande número de alunos por turma afetam qualidade e acesso à educação

quinta-feira, 7 Abril, 2022 - 22:45

Foto: Abraão Bruck/CMBH

O ensino híbrido, dividido entre aulas presenciais e remotas, continua a ser adotado nas universidades privadas de ensino superior em BH mesmo com a melhora dos indicadores da covid-19. O excesso de aulas virtuais, a fusão de turmas, a redução de disciplinas e o não uso dos laboratórios para atividades práticas, entre outras questões vêm desagradando alunos e docentes, que apontam perda de qualidade do ensino e descumprimento dos contratos firmados, em contraste com o aumento das mensalidades e dos lucros das instituições. Em audiência pública promovida nesta quinta (7/4) com o objetivo de dar voz aos estudantes, que se queixam da falta de canais de comunicação com os gestores, a Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo intermediou o diálogo entre as partes. Relatório da audiência será encaminhado ao Ministério da Educação (MEC), ao Ministério Público Federal e ao Procon para que avaliem as questões e tomem medidas para garantir o direito à educação e atender as partes mais frágeis e mais importantes do sistema.
 
Requerente da audiência, Macaé Evaristo (PT) explicou que o debate foi solicitado por um coletivo de estudantes dos Centros Universitários UNA e UNI-BH que organizou a pauta das reivindicações e busca no Legislativo espaço onde suas vozes sejam ouvidas e suas demandas tenham visibilidade, já que a entidade mantenedora - Ânima Educação - e as instituições não estão abertas à escuta e ao diálogo, segundo os alunos. A vereadora lembrou que a educação superior é competência do MEC, a quem cabem as atribuições de qualificar o ensino e promover acesso e permanência dos alunos, mas a abordagem do tema em âmbito municipal é pertinente, já que a formação dos jovens é um ativo importante para a cidade. Nesse sentido, é preciso pressionar os órgãos responsáveis para garantir que o direito à educação de qualidade seja cumprido e que estudantes e professores sejam ouvidos.
 
Menos qualidade e mais lucro
 
Estudante da UNA/Liberdade, Laysa Andrade confirmou a falta de canal de comunicação direta para o aluno apresentar a insatisfação com o ensino híbrido, já que contratou o curso na modalidade presencial. O aumento abusivo das mensalidades, para ela, não se justificaria, considerando que, com a ausência dos estudantes e professores, os custos não cresceram. Segundo a graduanda, as aulas práticas até o momento não foram repostas, embora sejam essenciais em grande parte dos cursos para a formação integral dos alunos. Gustavo Gripp, da UNA/Barreiro, reiterou as palavras da colega e disse que os estudantes estão em uma “luta bem forte” com a instituição, que já demonstrou atitude intimidatória, buscando desestimular as manifestações e sem explicar aumentos e as matérias não cursadas que foram perdidas. Raquel Rodrigues, do UNI-BH/Buritis, denunciou a fusão de turmas de diferentes períodos, o que desconsidera os níveis de complexidade das matérias e prejudica tanto os iniciantes quanto os avançados. "O diretor disse que o campus está sempre aberto para os alunos, que podem assistir as aulas online no local. Porque não aulas presenciais então?”, questionou a estudante.
 
Valéria Morato, do Sindicato dos Professores de Minas Gerais (Sinpro-MG), afirmou que a aglutinação de turmas também atinge os professores, que se sentem exaustos; em vez de cinco aulas em cinco turmas com 50 ou 60 alunos, hoje eles dão apenas uma para mais de 200 alunos, sem receber nenhum adicional. A sindicalista afirmou que a Ânima é campeã de redução de carga horária dos professores; só no início do ano, eles perderam mais de 1.200 horas/aula, mais que o dobro da segunda colocada. Valéria lamentou que as instituições privilegiem o lucro em detrimento da qualidade. Segundo ela, o Sinpro tem orientado os professores a não assinar a alteração de contrato que está sendo imposta, extremamente prejudicial à categoria, já que a tentativa de acordo com a mantenedora não teve sucesso. “Estamos em campanha reivindicatória; os professores precisam de respeito e autonomia e a educação não pode ser tratada como mercadoria”, protestou.
 
Gestores negam acusações
 
Humberto Cortela, da Ânima, Eduardo França, diretor da UNI-BH, e Mônica Fredim, da UNA, responderam pelas instituições. “Todos vivemos um momento de aprendizado, de adaptação a novas dinâmicas”, ponderou Humberto. Ele assegurou que a entidade cumpre as normas do MEC, citando a Portaria 2117/2019, que foi lida e discutida em reuniões com alunos. O texto, que determina a ampliação da rede e do acesso à educação superior, flexibilizou o tempo de presencialidade; de 80% presenciais e 20% virtuais, a divisão passou a 60/40. Os gestores explicaram que a divisão de 60% presencial e 40% virtual aplica-se a todo o período do curso, e não a cada semestre. Dessa forma, segundo eles, a carga horária pode ser ajustada ao longo do tempo até alcançar essa proporção. Neste primeiro momento, a entidade optou pela oferta de 50/50, o que teria sido comunicado aos órgãos de defesa do consumidor e ao Ministério Público. Embora considerem legítimas as questões pontuais de cada campus, curso ou estudante, os gestores disseram que o retorno das aulas presenciais não é um desejo unânime da comunidade acadêmica e afirmaram a existência de ouvidorias e canais próprios de comunicação para ouvir alunos e lideranças estudantis.
 
Quanto ao contrato, os responsáveis pelas universidades sustentaram que a palavra “presencialidade” não significa "cinco dias dentro da sala de aula", mas corresponde ao definido pelo MEC, ou seja, o mínimo de 60% de atividades presenciais. Eles também fizeram referência à cláusula que prevê a possibilidade da adoção de recursos tecnológicos. O aumento das mensalidades, por sua vez, obedece à Lei 9.870, que permite o repasse da variação de custos, conforme os gestores. Os custos também se mantiveram, segundo eles, com os campus abertos, acesso franqueado à tecnologia, empréstimo de equipamentos aos alunos e remuneração de docentes, tendo as instituições operado com prejuízo nos últimos três anos. Quanto ao contrato com os professores, foi dito a alteração não está sendo imposta, mas discutida. Mônica Fredim, da UNA, assegurou a oferta contínua de formação e capacitação dos professores em letramento digital, auxílio à adequação dos conteúdos às plataformas digitais e planejamento das aulas e reuniões semanais, além de programas de cuidado com a saúde mental.
 
Encaminhamento de relatório
 
Carol Custódio, diretora da União Estadual dos Estudantes e ex-aluna do UNI-BH, refutou as instituições e insinuou que elas se aproveitaram do período de ausência dos alunos para fechar dois campus sem qualquer explicação, comprar escolas que quebraram por causa da pandemia, e prejudicar professores e alunos com novas grades curriculares e cargas horárias, além de aumentar as mensalidades. Macaé Evaristo concordou que as instituições privadas precisam ter mais compromisso com a educação e responsabilidade social, sobrepondo as normas éticas e morais às normas jurídicas. A vereadora afirmou que, após esse primeiro passo, a Comissão continuará a dar voz às partes mais importantes e, ao mesmo tempo, mais frágeis do sistema educacional.
 
A vereadora relatou “estranheza” em relação aos setores que mais pediram a volta das atividades presenciais, quando os indicadores permitissem, agora trabalham com outros conceitos. "É necessário conversar mais e ter mais sensibilidade em relação aos sentimentos dos estudantes e à qualidade que esperam das instituições de ensino. Tamém é preciso pressionar o MEC para que a oferta educacional seja monitorada, avaliada e fiscalizada", considerou Macaé. Diante da ausência do Procon e do Ministério Público, o relatório da audiência será encaminhado formalmente a esses órgãos por meio da Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo para que as denúncias possam ser acompanhadas e avaliadas em seus âmbitos específicos. Macaé informou que já está em contato com a Câmara Federal e já obteve o compromiso da convocação de uma audiência sobre essa temática naquela Casa.
 
Superintendência de Comunicação Institucional 

Audiência pública para debater sobre "Os desafios enfrentados pelos estudantes e trabalhadores das instituições ensino superior privada de BH - 10ª Reunião Ordinária - Comissão de Educação