IMPASSE CONTINUA

Destino do Aeroporto Carlos Prates segue incerto

População da região pede que seja construído um parque, mas prorrogação das atividades do aeroporto pode ser publicada em alguns dias

quinta-feira, 24 Março, 2022 - 21:15

Foto: Abraão Bruck/CMBH

A polêmica em torno do Aeroporto Carlos Prates tem um novo capítulo a cada dia. O iminente encerramento das atividades, marcado para o próximo dia 1º de maio, e a completa ausência de consenso entre moradores e a associação que atua no espaço mostram que esta história ainda terá novas páginas. Para tentar dar voz a todos os envolvidos, uma audiência pública foi realizada na tarde desta quinta-feira (24/3), pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário. Durante o encontro, do qual participaram representantes da comunidade e de diversos órgãos, empresas e entidades que atuam no aeroporto, moradores alertaram que não vão deixar de lutar para que a área seja destinada a um parque público. Já a associação continuará sua batalha para provar que pode, sim, garantir uma gestão viável do aeroporto, a partir da saída da Infraero do local. Também foi apresentada informação de que as atividades do aeroporto não serão finalizadas em maio e continuarão, pelo menos, até o final de 2022.

Atividades suspensas e aumento de custos

Solicitada pelo vereador Rubão (PP), a audiência foi realizada após uma visita técnica ao local, ainda no início de fevereiro. Na ocasião, o superintendente do Aeroporto Carlos Prates, Mauro Lúcio Diniz, confirmou que a determinação vigente é de que todas as atividades de pousos e decolagens sejam interrompidas a partir do próximo dia 1º de maio e que as operações de manutenção e treinamento, hoje realizadas pelas aeronaves do governo do Estado, Polícias Militar e Civil e Bombeiros, estariam igualmente suspensas.

A notícia deixou apreensivos dirigentes da Associação Voa Prates, que reúne as cinco escolas de aviação que utilizam o local, donos das empresas de manutenção (Claro e Starflight) e ainda dirigentes das entidades de segurança pública. Durante o encontro, o Capitão PM Robson afirmou que o órgão ainda não dispõe de planejamento para onde levar as suas aeronaves no caso de fechamento do Carlos Prates. Questionado por Rubão se existiria a possibilidade de um outro local que recebesse as atividades, o capitão lembrou que isso pode incidir em novos custos ao erário público. "É possível fazer na Pampulha, mas é um aeroporto mais complicado, porque é bem mais movimentado. Se for para Pará de Minas teria impacto financeiro e acredito que seja assim também para os demais órgãos públicos", afirmou.

Pedido do prefeito adiou fechamento e definiu novo prazo

Esta não é a primeira vez que o campo de pouso, criado há quase 80 anos, sofre com a possibilidade de fechamento das portas. O prazo, que inicialmente estava marcado para o dia 31 de dezembro de 2021, foi prorrogado a pedido da Prefeitura de BH que defendeu a gestão local do espaço e com ofício enviado ao governo federal conseguiu a prorrogação até maio. O posicionamento do Município, segundo o presidente da Voa Prates, Estevan Lopes, veio após o prefeito Alexandre Kalil (PSD) tomar ciência da importância das atividades que ali são desenvolvidas e que têm caráter social; dentre elas o atendimento de 500 alunos nas escolas de pilotagem, sendo cerca de 65% estudantes assistidos pelo Fundo de Financiamento Estudante do Ensino Superior (Fies), o que torna Minas Gerais o segundo pólo formador de pilotos no Brasil.

Ainda segundo Estevan, o chefe do Executivo e também o governado Romeu Zema teriam ficado encantados com o trabalho desenvolvido pelas escolas de aviação. Ele lembrou que outro ponto relevante do Carlos Prates é a agilidade que o campo proporciona às aeronaves das forças de segurança que chegam a ter exclusividade de uso em ocasiões de emergência, como nos casos de incêndio, onde são utilizados modelos Air Tractor, que otimizam o combate a focos de incêndio dispersos e em áreas de difícil acesso. "O governo contratava isso e hoje os Bombeiros ganharam duas destas aeronaves. Quando elas estão operando ninguém usa a pista; é prioridade, elas nem desligam o motor; então é uma operação importantíssima", afirmou.

De acordo com o presidente da associação, a situação do aeroporto tem sido levada ao conhecimento de outras autoridades e que tornar tudo isso conhecido pode contribuir para impedir os planos da Secretaria de Desestatização, que é de vender a área e permitir a construção de moradias. "Se não nos juntarmos para fazermos algo bom para todo mundo, é isso que será feito. Eles vão vender a área e deixar a gente com o problema. O senador Alexandre Silveira (PSD) disse que as atividades serão prorrogados até 31 de dezembro deste ano e a publicação deve sair nos próximos dias", esclareceu.

Comunidade sofre com o impacto das atividades

Questionado por Rubão sobre como a população do entorno vê as atividades do aeroporto, Munish Prem, que é dirigente do Coletivo Cultural Noroeste e morador que nasceu e cresceu na região, contou que a luta para que as atividades de pouso e decolagens sejam suspensas já dura anos e que a poluição sonora, o medo de acidentes e a desvalorização dos imóveis na região tem adoecido a população que vive no entorno. Munish disse ainda que ficar encantado sem sofrer os impactos da atividade é bem mais fácil.

De acordo com o diretor do Coletivo, durante reunião com o prefeito e com a vereadora Duda Salabert (PDT), em agosto do ano passado, a comunidade deixou bem claro que deseja que a desativação do aeroporto seja uma oportunidade para a região receber uma nova área verde. "Marcamos uma reunião com Kalil em agosto e, em conversa com a Duda e em pesquisa com os moradores, vimos que a população quer um parque. Não temos nada aqui, não temos praças, não temos áreas verdes. Queremos ter um lugar para as famílias fazerem um piquenique, queremos reflorestar a área, respeitando o traçado do aeroporto, e usar os hangares para um museu da aviação", ressaltou lembrando que Minas Gerais é o berço da aviação, com Santos Dumont.

Ainda segundo Munish, as escolas de aviação poderiam, por exemplo, migrar para o aeroporto de Betim, que está em fase de projeto, sendo construído para atender principalmente demanda da Fiat e de Inhotim, e que já se dispuseram a receber a atividade de formação. "Os alunos podem sim pegar um ônibus e irem para lá. Também fico encantado com o trabalho que eles fazem (associação), mas eles não moram aqui, não sofrem os impactos da atividade. Não somos contra a escola, não somos contra a aviação, mas não é possível que um paciente de hospital esteja fazendo quimioterapia com aquele zunido de aeronave na cabeça", declarou.

Oportunidades, déficit e invasão

O hospital a que Munish se refere é o Alberto Cavalcanti, referência no tratamento do câncer e que divide muro com o Carlos Prates. Entretanto, para Cláudio Gomes da Silva, dono da Claro Aviação, o que parece ser um problema pode ser na realidade, uma oportunidade. Segundo o empresário, o hospital é estratégico e pode se tornar uma referência na realização de transplantes, tendo como apoio o aeroporto que pode receber de forma ágil os órgãos vindos de outras partes do Estado. "É um contra-senso fechar um aeroporto e criar um museu. Nos EUA todos os museus estão dentro de aeroportos em funcionamento. Além disso, sobre a área verde, tem a mata da PUC, tem a mata da Universidade Federal, tudo cercado e ninguém fala nada. Não precisa nem criar a mata ela já está lá", afirmou.

Gerido pela Infraero, e há cerca de cinco anos acumulando déficits contínuos de R$1,5 milhão a R$ 2 milhões, a solução para o Carlos Prates, de acordo com Claudio, precisar ser pensada agora, por meio de um projeto que atenda à comunidade, empresários, entidades e alunos, implementando uma gestão viável e que garanta o caráter social da atividade. Segundo o empresário, foi feita uma busca nos cartórios da cidade afim de conhecer os donos originais da área de cerca de 500 mil m2 e foi descoberto um documento que atesta que em 1971 houve uma desapropriação por parte do governo federal adquirindo toda a extensão e garantindo seu fim social. "Ele (o terreno) não pode ser vendido. Caso acabe, o aeroporto só pode ser utilizado para fins sociais. Não pode ser comercializado e não pode ter sua atividade desvirtuada. Então se não houver um projeto viável, a área pode ser tornar uma invasão, já que não há segurança jurídica", afirmou.

Insegurança jurídica e escritura

A insegurança jurídica mencionada também foi apontada pelo assessor da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Eduardo Tavares. Segundo o técnico, que teve acesso à documentação enviada por Cláudio ainda durante a audiência, o documento do cartório trata-se de uma Carta de Sentença, que é feita por meio de um processo judicial, quando não existem muitos elementos sobre a propriedade do imóvel. Inclusive ressaltou Eduardo, "destaco o último parágrafo que diz que o imóvel já pode ter sido total ou parcialmente alienado, então esse documento não é prova da posse".

Segundo o assessor da secretaria, ele já tinha conhecimento de parte dessa situação porque teve em suas mãos o termo de doação, que o então proprietário da área, Coronel Abílio Machado, fez ao Aeroclube de Minas Gerais no ano de 1940. Segundo Eduardo, ele não tem informação sobre quando foi que o aeroclube passou a gestão à Infraero, mas a União não poderia dispor da área, caso ela não tenha uma escritura com registro e matrícula. "É isso que tem que ser pedido na Infraero, ou na Secretaria Geral de Patrimônio da União. Se eles não tem esse documento, eles não podem dispor dela (área), porque trata-se de uma doação de um particular ao Aeroclube", afirmou o assessor, dizendo ainda que o termo de doação deixa explicito que se o terreno não for utilizado para atividades do Aeroclube, deve ser devolvido à família.

Sobre a possibilidade da área abrigar um parque verde, o assessor reconheceu a carência deste tipo de espaço na região, porém lembrou que o terreno e a topografia não ajudam e defendeu que o mais importante seria encontrar a documentação com o termo de doação.

Antes de encerrar o debate, Rubão questionou Munish se haveria algo que o aeroporto poderia fazer para não trazer transtorno para a comunidade ao que o dirigente do Coletivo afirmou que uma pesquisa realizada por eles não região confirma que 90% dos moradores são contra o Aeroporto estar ali. "O que a comunidade quer é a transferência dessa atividade aqui e a população vai lutar para isso, para que as atividades possam ser levadas para um outro lugar que dê segurança ao aeroporto e à comunidade", concluiu.

O vereador finalizou os trabalhos comprometendo-se a realizar novos debates com o objetivo de ouvir a todos e levar o tema para a cidade, buscando assim, a construção de uma solução conjunta.

Assista ao vídeo com a íntegra da reunião.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para elucidar as razões do fechamento do aeroporto do Carlos Prates - SBPR - 8ª Reunião Ordinária - Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e Sistema Viário