ABUSO DE PODER

Servidor atesta autoria de documentos e admite insegurança jurídica para indicar proprietário

Advogado admite que fez uma inferência para associar o nome de Moisés Kalil, baseado em depoimentos

quinta-feira, 20 Abril, 2023 - 18:30
Imagem da reunião. Participantes sentados em mesa em formato de U

Foto: Bernardo Dias/CMBH

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) - Abuso de Poder na PBH ouviu nesta quinta-feira (20/4) o advogado Thiago Penido Martins que atestou a veracidade da documentação que foi anexada ao processo que culminou na desistência de ação de cobrança de dívida do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) envolvendo o ex-prefeito Alexandre Kalil e/ou empresas da sua titularidade. Ele confirmou que o documento em questão foi uma resposta dada por ele a uma demanda da Procuradoria-Geral do Município (PGM) e que não há segurança jurídica para indicar o proprietário do terreno desapropriado. O publicitário Lucas Couto de Souza também foi ouvido nesta quinta sobre as circunstâncias da sua nomeação na Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte (Belotur) e garantiu que foi indicado ao cargo por conta de seu currículo. Os requerimentos foram assinados pelos vereadores Fernanda Pereira Altoé (Novo), Ciro Pereira (PTB), Cleiton Xavier (PMN) e Wesley Moreira (PP), e pelo ex-vereador Uner Augusto.

Ao confirmar ser o autor do documento que foi juntado no processo 119259- 50.2015.8.13.0024, o advogado Thiago Penido informou que recebeu, por email, uma demanda da Procuradoria e explicou que “toda vez que a PGM tem dúvidas sobre a desapropriação do imóvel faz pedidos de esclarecimentos sobre desapropriações para a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap)”. Ele disse ainda que, a partir dessa solicitação, é feita uma análise dos documentos na base de informações da Sudecap. O advogado esclareceu para o presidente da CPI, Wesley Moreira, que o email tem poder de ofício, chegou por intermédio do superior hierárquico e foi respondido em nome do departamento pelo email institucional. Ele salientou que optou por enviar arquivos anexos em word pois estava em home office e assim teria a possibilidade de inserir imagens extraídas da base de dados da Sudecap. Fernanda Altoé ponderou que, sendo uma resposta por e-mail emitido pela área tributária da PGM, “então houve um equívoco de quem juntou a resposta sem anexar a demanda da PGM”. 

Thiago explicou como é feito o trabalho de campo no qual os técnicos analisam o terreno e entrevistam os moradores e vizinhos com vistas a produzir o memorial descritivo. No caso em questão, tratava-se de um terreno indiviso que gerou 32 cadastros técnicos de desapropriação, o que significa 32 lotes a serem desapropriados. Segundo ele, durante o processo, nem todos conseguiram comprovar ser o real proprietário do terreno e, quando isso acontece, o interessado deve provar em juízo a propriedade para fins de recebimento de indenização.

Questionado por Fernanda Altoé, Thiago informou que sua resposta para a PGM não se baseou em índice cadastral, mas em cadastro técnico para fins de desapropriação. A vereadora ressaltou que o pedido de informação não fez referência ao cadastro técnico e quis saber como ele chegou ao nome do suposto proprietário. O advogado reconheceu que foi por inferência. “Eu conheço cada um dos proprietários e os vizinhos afirmavam que o terreno era de propriedade da família Kalil. Confesso que fiz de forma intuitiva, pois era o único imóvel vazio”, admitiu.

Ao responder como chegou ao nome de Moisés Kalil, o servidor contou que, a princípio, todos os imóveis pertenciam a Luciano Magno, mas durante os trabalhos de pesquisa e verificação, descobrimos que os proprietários eram outros. “Além do contato com todos os desapropriados que presumiam que o imóvel pertencia à família, havia também, na documentação do inventário, um alvará de licença, que permitia que Amélia Kalil assinasse a desapropriação do imóvel”. O advogado explicou que o nome de Moisés Kalil não é mencionado no processo de desapropriação, apenas no alvará. "Não há nada que nos dê segurança jurídica e por isso não há herdeiros habilitados para receber a indenização, que ultrapassa R$ 2 milhões”.

Thiago Penido reiterou que as informações foram prestadas por ele de acordo com a base de dados do cadastro de desapropriação. “Havia uma cobrança de tributos e o Kalil alegou que o terreno já havia sido desapropriado. A PGM pediu para a Sudecap averiguar a veracidade. A minha resposta foi que não havia elementos suficientes para confirmar a informação”. Ele explicou ainda que, a partir do momento que o Município propõe uma ação judicial, cabe aos interessados provar a titularidade. “Já tínhamos o principal objetivo: a obra já estava sendo executada. Não cabia ao Município buscar quem era o possuidor do terreno”, finalizou.

Cargos comissionados na Belotur

O publicitário Lucas Couto de Souza, que atuou no Clube Atlético Mineiro de 2017 a 2020, na gestão de Daniel Nepomuceno, assegurou que, apesar de ter participado da campanha em 2020, não tem relações pessoais com Alexandre Kalil, que foi contratado após passar por entrevista com o presidente da  Belotur, Gilberto Castro, como assessor da presidência por causa do seu "excelente" currículo e que doou R$ 40 mil para a campanha do ex-prefeito Kalil por acreditar em uma nova política para a cidade. Fernanda Altoé questionou e ficou sabendo que o publicitário também fez doações para a campanha de Daniel Nepomuceno antes de ir trabalhar com ele no Clube Atlético Mineiro.

Questionado pelos vereadores, Lucas Couto informou que viajou diversas vezes pelo clube para atender demandas de sua função como diretor de marketing; que nunca fez pedido de viagens pessoais para a empresa Unitour nem deixou a esposa viajar pelo clube; e que desconhece se havia funcionários do Atlético que utilizavam os serviços da empresa. Ele reconheceu que Eloá Ribeiro era vista com frequência na presidência do Atlético e que todas as viagens de delegações eram tratadas com ela ou com o marido, deixando claro que nunca participou das tratativas de viagens. 

O publicitário assegurou que não tem relações com Antonilde Prata Ribeiro que, apesar de ser marido de sua ex-sócia na empresa Sol Consultoria, é apenas um conhecido. Em razão disso, não soube informar se ele está ou não nomeado em cargo na PBH. Questionado se tinha contato com a Empax Mídia quando atuou no Galo, respondeu que o clube tem muitos prestadores de serviço e que ele atendia a todos. Ele fez questão de ressaltar que nunca foi ordenador de despesas. 

Lucas enfatizou que não foi convidado para trabalhar na Belotur, embora já conhecesse Gilberto Castro “do mercado”. Assim como sua agora ex-esposa, Daiane Couto - que trabalhou na Secretaria Municipal de Assistência Social e, após a sua saída, na Belotur - , passou por entrevista e teve o currículo avaliado. Ele explicou que também já conhecia Adriana Branco da época em que atuou no Galo, tendo inclusive vários amigos em comum, e que chegou a fazer várias reuniões com ela quando trabalhava na Belotur. Questionado sobre o tema das reuniões, foi enfático: “as coisas do Galo quem decidia era o presidente. Sempre fui um funcionário do clube”. 

Ao destacar que chegaram a trabalhar concomitantemente na PBH, Cleiton Xavier questionou se a doação teria influenciado na contratação de Lucas e de Daiane. Lucas Couto negou a afirmação e disse que ambos têm currículo para executar o que se propõem. Ele contou que Daiane, cujo currículo é público na plataforma Linkedin, tem diversas especializações em marketing e atuou como gerente na Belotur depois que ele se desligou da empresa. Segundo ele, tanto na secretaria quanto na Belotur, Daiane cumpria horário e é comprometida com seu trabalho. 

Fernanda Altoé quis saber sobre o envolvimento do publicitário no processo de patrocínio do Carnaval 2023, uma vez que Lucas Couto saiu da Belotur e ocupou uma vaga na Fecomércio - única patrocinadora do Carnaval 2023. O publicitário explicou que a Fecomércio não participou da licitação e que o então presidente ficou sabendo, por meio da imprensa, que o certame foi deserto. Ele admitiu que fazia parte de suas funções na Belotur a captação de recursos, que procurou diversas empresas em busca de patrocínio para o evento, que acompanhou os editais como assessor da presidência, mas que deixou a empresa antes do final do processo. Ele salientou ainda que, na Fecomércio, não participou do processo por ser esse um assunto pertinente à diretoria, da qual ele não faz parte. Lucas não soube dizer por que não houve patrocinadores interessados e afirmou acreditar que todo o processo tenha sido transparente.

Advogado do ex-prefeito Alexandre Kalil, Tarcísio Maciel quis se certificar de que a nomeação de Lucas Couto para ocupar cargo na Belotur foi mesmo de Gilberto Costa. Ele também quis entender qual ilegalidade está sendo investigada, uma vez que cargo de confiança é de livre nomeação. “Me parece razoável que, tendo trabalhado no Clube Atlético Mineiro, meu cliente busque lá suas indicações. Gostaria de esclarecer qual nomeação está sendo investigada e qual a ilegalidade dessa nomeação”, pontuou. Reconhecendo a veracidade da premissa,  Altoé alertou que a nomeação encontra parâmetros e limites e que a designação concomitante de marido e mulher pode sim configurar nepotismo. “Cargos de chefia, direção ou assessoramento podem influenciar quais as pessoas ocuparão cargos de confiança”, disse. A parlamentar revelou ainda que a CPI teve acesso a e-mails nos quais Adriana Branco, então secretária municipal de Assuntos Institucionais e Comunicação, indica Lucas Couto para trabalhar na Belotur,  e solicita que o indicado não encaminhe para ela e-mails institucionais.

Superintendência de Comunicação Institucional 

Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI - Abuso de Poder na PBH - 13ª Reunião - Oitiva para ouvir Thiago Penido Martins e Lucas Couto de Souza