RESISTÊNCIA

Mulheres negras e indígenas reivindicam ações contra discriminação racial em BH

Audiência lembrou o Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha e o Dia de Tereza de Benguela, em 25 de julho

sexta-feira, 16 Julho, 2021 - 18:00
Vereadoras Macaé Evaristo e Iza Lourença e as convidadas Winy Franklin e Valéria Regina Neves, em audiência pública da Comissão de Mulheres, nesta sexta-feira (16/7)

Foto: Karoline Barreto/ CMBH

Religião e cultura latina, feminismo e mercado de trabalho: os temas estiveram em destaque na audiência pública da Comissão de Mulheres, realizada nesta sexta-feira (16/7), que discutiu o movimento de resistência e luta de mulheres, em referência ao Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha e ao Dia de Tereza de Benguela, celebrados em 25 de julho. Em Belo Horizonte, a data é celebrada oficialmente como Dia Municipal da Mulher Negra “Dona Valdete da Silva Cordeiro”, conforme legislação municipal, sancionada em 2016. A audiência contou com a presença de representantes de práticas religiosas, causas negras e indígenas e da área da Cultura e do Direito em BH. Nova audiência, no dia 23 de julho (sexta-feira), vai dar sequência ao debate, buscando mecanismos para prevenir e combater a violência política contra mulheres negras e mulheres trans.

Ressaltando a desigualdade social, racial e de gênero na cidade, as requerentes da audiência, Macaé Evaristo (PT), Iza Lourença (Psol) e Bella Gonçalves (Psol), afirmaram a importância da memória e da esperança, da história e ancestralidade dessas mulheres.

Religião e trabalho

No que se refere à religião, Valéria Regina Neves, makota da Roça de Candomblé Manzo Inkice Kavungo de Lagoa Santa/MG, destacou a ação do trabalho e do sagrado associados, em atividades diárias em terreiros. Na oportunidade, ela falou sobre a resistência de mulheres negras do axé, que podem contribuir para o desenvolvimento local e nacional, político, social e econômico.

No que tange à representatividade latina, Avelin Buniacá Kambiwá, do Comitê Mineiro de Apoio às Causas Indígenas, mencionou a falta de representatividade indígena na latinidade. Ela defendeu uma reconstrução dessa representação, a partir de uma América multilateralizada, sem ter como referência a colonização de espanhóis e portugueses, mas com respeito à identidade e à ancestralidade. Buniacá reivindicou o reconhecimento do trabalho indígena, citando problemas como a feira de artesanatos da Feira da Avenida Afonso Pena, que teria espaço limitado para esses artistas.

Lázara dos Anjos, mulher trans, negra e ativista da cultura de BH, também defendeu ações mais efetivas. Ela é contrária a ações educativas como "ensinar o cis branco sobre questões de gênero", proporcionando-lhe uma espécie de alívio quanto ao preconceito e à discriminação ou causando-lhe pena diante de uma "necessidade de inclusão no cenário social". Considera que essas ações reforçam uma indevida e suposta supremacia cis branca e de gênero.

A ativista alerta que a remuneração para brancos e negros na área da Cultura em Belo Horizonte é diferenciada, com valores inferiores para negros. Outro dado apontado é que, no mundo profissional, travestis são forçadas a moldar seus discursos na cidade e não têm voz como mulheres, como se não existissem. Relatando casos de ameaça de demissão e exclusão do mercado de trabalho, a ativista apontou, como alternativa de enfrentamento, o constrangimento aos agressores e a coragem por parte dessas mulheres, e não a desconstrução.

Makota Celinha, do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira (Cenarab), defendeu o esperançar na resistência, para sobrevivência na pandemia. Lembrando que mulheres negras nunca tiveram direito a seus corpos e lares, afirmou que a cidade é racista e homofóbica, citando como exemplo o parlamento.

Garantia de direitos

Especialista em Direito Processual e assessora jurídica parlamentar na Câmara Municipal de BH, Winy Franklin (Winy Mangabeira) destacou que a violência contra a mulher é enfrentada desde a gestação (acompanhamento clínico-neonatal e violência obstétrica); mas considera que a mulher tem um poder de transformação social, por meio da educação contra o racismo e da emancipação socioeconômica.

Como advogada popular, ela salientou que o Direito pode contribuir para modificar estruturas sociais, como o racismo, com o auxílio de autores negros, que abordam, na literatura, a reflexão sobre o racismo estrutral e o extermínio da juventude negra. A assessora jurídica destacou que, no Direito, o racismo é direcionado à área penal, que o tipifica como injúria racial. Contudo, afirmou que têm sido ampliadas as doutrinas jurídicas voltadas ao direito da população negra. No Ministério Público, por exemplo, estão sendo disponibilizadas cotas para negros. Também foi aberto edital para liberação de vagas para mulheres negras e indígenas em curso preparatório para ingressar na carreira da magistratura.

Winy Franklin relatou, ainda, que, na Defensoria Pública, foi aberto núcleo para discutir assuntos étnico-raciais, como cotas em concursos públicos, questionando então a existência de cotas na Câmara Municipal de Belo Horizonte. Segundo ela, o racismo também está sendo debatido no Supremo Tribunal Federal.

Arte e assistência social

A atriz, arte-educadora, produtora cultural e ativista Carla Andréa Ribeiro disse que coloca o corpo a serviço da arte e a políticas voltadas à igualdade, para produzir mundos possíveis para a preservação dessas culturas.

Makota Cássia Kidoiale, do Quilombo Manzo Ngunzo Kaiango e presidente do Conselho de promoção da Igualdade Racial em Belo Horizonte, ressaltou, por sua vez, a importância do atendimento e acolhimento a esse segmento nos Centro de Referência em Assistência Social (Cras) da capital, especialmente no contexto pandêmico. Também alertou para a necessidade de fiscalização sanitária em escolas públicas nesse momento. Ela falou sobre o despreparo da estrutura das escolas, lembrando que os funcionários das instituições de ensino ainda não foram vacinados. Para Kidoiale, é preciso reavaliar a abertura das escolas nesse período.

Participaram da audiência as vereadoras Bella Gonçalves (Psol), Fernanda Pereira Altoé (Novo), Iza Lourença (Psol) e Macaé Evaristo (PT).

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater a resistência e diversidade das mulheres negras, latino-americanas e caribenhas- 19ª Reunião Ordinária - Comissão de Mulheres