Economistas defendem mais investimento no setor de bares e restaurantes de BH
Proposta que busca limitar funcionamento de adegas e distribuidoras no período noturno gerou questionamentos
Foto: Tatiana Francisca/CMBH
A cultura e a economia dos bares e restaurantes da capital mineira foram tema de audiência pública realizada pela Comissão Especial de Estudo de Gastronomia, Moda e Turismo em BH na manhã desta segunda-feira (13/10). Entidades representativas do setor de serviços da capital destacaram os números e os impactos positivos e crescentes que esses estabelecimentos têm trazido para a arrecadação tributária, o turismo e o fomento à cultura gastronômica da cidade. Juhlia Santos (Psol), solicitante do encontro, destacou que “milhares de famílias” também têm seus empregos nos “botecos” de BH. As adegas e distribuidoras, porém, deveriam ter sua forma de funcionamento alterada, segundo Sargento Jalyson (PL). O parlamentar é autor do Projeto de Lei 485/2025, que busca restringir o funcionamento desse tipo de comércio no período noturno, a fim de evitar episódios de “perturbação da ordem” no entorno desses estabelecimentos. Juhlia Santos, porém, defendeu regulamentação para o serviço prestado por essa categoria “e diálogo”, ao invés de “criminalização”.
Setor estratégico
Juhlia Santos lembrou a conquista, por Belo Horizonte, do título de Cidade Criativa da Gastronomia, concedido pela Unesco em 2019 e que, segundo a parlamentar, está “vinculado diretamente” aos bares e botecos da capital. Além da comida, ela destacou que esses estabelecimentos oferecem espaços de socialização — “são os lugares onde a gente se encontra”, disse —, e se tratam ainda de uma das economias que mais movimentam a cidade. “São setores estratégicos que botam a comida na mesa de muita gente”, completou Juhlia.
A parlamentar lembrou algumas das categorias profissionais que atuam no setor, como garçons, cozinheiros, músicos e fornecedores de alimentos; muitos dos quais, segundo ela, têm sido prejudicados pela redução do quadro de horários noturno do transporte coletivo por ônibus desde a pandemia de covid-19. Para Juhlia Santos, isso também tem contribuído para o “déficit de acesso” do público aos bares.
“São milhares de famílias que dependem da nossa vida noturna para pagar o aluguel, botar o filho na escola, manter as suas famílias”, destacou a parlamentar.
Economista da Federação do Comércio, Serviços e Turismo de Minas Gerais (Fecomércio-MG), Gabriela Martins trouxe dados do setor na capital. Belo Horizonte possui atualmente 4.835 bares, número que equivale a 20,4% dos estabelecimentos desse tipo em todo o estado de Minas Gerais. “É [um percentual] muito expressivo”, destacou Gabriela. Centro, Savassi, Santa Tereza e Sagrada Família são os bairros com maior número de bares. Os dois primeiros também figuram no topo da lista de restaurantes, seguidos por Lourdes e Santa Efigênia.
Ainda segundo a representante da Fecomércio-MG, bares e restaurantes movimentam cerca de R$ 48 milhões em salários por mês na capital, e o número de empregos formais do setor tem crescido. No que se refere aos bares, o número saltou de 3.137, em 2022, para 3.489 em 2025. O setor de restaurantes tinha 20.728 empregos formais em 2022 e, neste ano, o número é de 23.353. Gabriela Martins apontou, no entanto, que houve uma leve queda no número de estabelecimentos. De um total de 13.538 bares e restaurantes, Belo Horizonte possui, hoje, 13.143 empresas formais nesse setor. Em sua apresentação, a economista destacou que os negócios “impulsionam a economia local”, gerando empregos e renda para a capital.
“Investir no setor é essencial para o crescimento sustentável e a prosperidade contínua da cidade”, destacou a representante da Fecomércio-MG.
Valquíria Assis, do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), destacou que os impactos da cultura gastronômica de BH não se restringem somente aos bares e restaurantes, mas impulsionam também o turismo da capital. A economista citou a pesquisa Radar Turístico de Belo Horizonte, publicada em julho deste ano pela PBH e Belotur, com os dados consolidados de maio, que mostrou “crescimento expressivo” na ocupação de hotéis e no fluxo de entrada de passageiros no Aeroporto de Confins e na rodoviária da capital em relação ao mesmo período de 2024. “E a gente vê que isso acaba tendo um impacto muito grande na arrecadação de Belo Horizonte”, afirmou Valquíria. Ela citou ainda a arrecadação do Imposto sobre Serviços (ISS) no período analisado, que somou cerca de R$ 16 milhões, alta de 6,4% em relação ao do ano anterior.
Nesse sentido, a conselheira do Corecon-MG demonstrou preocupação em relação ao PL 485/2025, que busca limitar o horário de funcionamento de adegas e distribuidoras de bebidas na capital, de autoria de Sargento Jalyson (PL). A proposta tramita em 1º turno e, neste momento, está sob análise da Comissão de Legislação e Justiça, primeiro colegiado a apreciar as proposições na Casa. Entre os possíveis impactos negativos que vislumbra com a aprovação da proposta, Valquíria Assis citou a redução das margens de lucro de bares e restaurantes; da vida noturna e do turismo na capital; a possibilidade de deslocamento de demanda de consumidores para municípios vizinhos; insegurança regulatória; risco de desemprego; e também redução da receita com o ISS. “E a gente sabe que essas receitas, essa arrecadação, acabam influenciando direta e indiretamente políticas públicas para a população”, destacou.
Fiscalização pública
“Nós temos que alegrar essa cidade. Quanto mais ficarem abertos [os bares e restaurantes], melhor. Essa é a posição da Fecomércio-MG”, declarou Alexandre Dolabella, assessor de Relações Institucionais da federação, que completou: “respeitando a lei e respeitando a vizinhança”.
“A fiscalização, primeiro, tenta conversar”, contou Ilber Henrique, fiscal de Controle Urbanístico e Ambiental de Belo Horizonte e representante do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais da cidade (Sindibel). Ele estima que “apenas uns 5%” do total de empreendedores do setor de bares e restaurantes, sobretudo na Região Centro-Sul, descumprem as normas que regem o setor. Para esses casos, o fiscal é responsável por, segundo suas palavras, “mediar o rigor da lei” através de interdições, que vão desde uma notificação, passando pela multa, até a cassação do alvará de funcionamento.
Sargento Jalyson esclareceu que o PL 485/2025 não trata de bares e restaurantes “em momento algum”, nem se propõe a regulamentar esses estabelecimentos. “O projeto tem única e exclusivamente o objetivo de alterar a forma de funcionamento de adegas, distribuidoras e congêneres”, disse o parlamentar, explicando que esses “congêneres” se referem a estabelecimentos que têm como atividade principal a venda de bebida alcoólica para consumo “fora do local”. “Esses, sim, são o ponto focal do meu mandato pela desordem pública que está sendo gerada”, afirmou Sargento Jalyson. O vereador lembrou que foi autor do projeto que deu origem à Lei 11.884/2025, que inseriu o Festival Comida di Buteco no calendário oficial de festas e eventos da capital, e também do PL 270/2025, que busca destacar o concurso como patrimônio cultural imaterial de BH.
Adegas e distribuidoras
Sargento Jalyson citou a ocorrência frequente de festas clandestinas “com som alto” e episódios de violência na Avenida Guarapari, Bairro Santa Amélia, na Região da Pampulha. As causas desses episódios seriam, segundo ele, as adegas e distribuidoras que funcionam no local sem limite de horário. O tema motivou audiência pública ocorrida em setembro a pedido do vereador. Para ele, o número de fiscais para apurar denúncias de perturbação do sossego na capital é “muito deficitário”.
“O grande causador dessa desordem, na minha visão, é a ausência de fiscalização; porque lei nós temos”, disse Sargento Jalyson.
Moradora do Bairro Santa Amélia, Valquíria Monteiro disse que frequenta os bares e restaurantes da Avenida Guarapari e nunca teve “problema nenhum” com o funcionamento desses estabelecimentos, mas sim com as adegas e distribuidoras, “que não respeitam a legislação”, segundo ela. “Os restaurantes também sofrem com a questão”, completou Valquíria, fazendo menção às aglomerações sem espaço apropriado, quase sempre com carros de som “em volume alto”. “A gente não aguenta mais. Eu trabalho de segunda a sexta, sábado eu dou aula de manhã; então, gente, não dá”, disse a moradora.
O fiscal Ilber Henrique, no entanto, apontou que o PL 485/2025 pode esbarrar na possibilidade de adegas e distribuidoras já possuírem ou virem a emitir o CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) como bares e restaurantes, o que impediria a limitação prevista na proposta.
“Eu acho que tem outros caminhos que a gente pode encontrar para além da criminalização”, disse Juhlia Santos, fazendo menção às restrições previstas pelo projeto de lei. Para a parlamentar, “toda a cidade perde” com o cerceamento das atividades dos bares e distribuidoras da capital. Para Juhlia, as adegas também deveriam ser entendidas como bares de BH, “e não enquanto sujeitos que vão fomentar o crime, a desordem, ou coisa do tipo”, disse. “Precisa regulamentar? Precisa. Mas não vai ser com um projeto de lei que beira a criminalização que a gente vai chegar neste caminho”, completou Juhlia.
Superintendência de Comunicação Institucional



