MOBILIDADE URBANA

Especialista em teleféricos expõe benefícios e limites do modal

Vantagens incluem custo e prazo de implantação, adequação à topografia, preservação de edificações e possibilidades de integração

quinta-feira, 16 Março, 2023 - 23:00

Foto: Barbara Crepaldi / CMBH

A busca de soluções para melhorar a eficiência e a qualidade do transporte coletivo é uma das principais atribuições da Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara de BH. Para conhecer melhor os sistemas de teleféricos urbanos, já adotados em diversas cidades do mundo, e avaliar a viabilidade de sua utilização no município, o colegiado recebeu nesta quinta (16/3) o diretor executivo do Grupo Doppelmayr/Garaventa, líder mundial desse mercado. O encontro, acompanhado por especialistas e interessados, deu prosseguimento aos estudos e debates promovidos pelo Grupo de Trabalho (GT) Mobilidade BH, instituído pela comissão em 2021. O empresário Rafael Lemos apresentou dados e exemplos do uso do teleférico em sistemas multimodais de mobilidade urbana, destacando suas vantagens em termos de custo de implantação e manutenção, baixo impacto urbanístico e ambiental e ausência de impedimentos de fluxo que proporcionam maior previsibilidade e conforto para o usuário. Atendendo a solicitação do presidente Braulio Lara (Novo), o gestor se dispôs a fornecer as informações e orientações necessárias ao colegiado para subsidiar o debate e viabilizar a elaboração de um projeto que atenda às necessidades e especificidades do município.

Rafael ressaltou que o uso de teleféricos como opção de mobilidade, ainda pouco explorado no Brasil, possui grande potencial de crescimento em termos de aplicabilidade e possibilidades de utilização no ambiente urbano. A indústria automotiva, segundo ele, que ainda se vende como melhor opção e sonho de consumo, em detrimento do transporte público, não atende de fato o que as pessoas desejam e causa grandes congestionamentos de trânsito em centros urbanos. Segundo ele, o custo estimado dos congestionamentos nas 10 maiores regiões metropolitanas do Brasil em 2018 foi de R$ 267 bilhões, considerando o combustível queimado e a perda de tempo produtivo. Hoje, várias cidades do mundo vêm apostando na combinação inteligente de modais para melhorar a qualidade e atratividade do transporte público; dentre eles, o teleférico vem se destacando como opção segura, confortável e confiável, geralmente utilizado como sistema complementar de mobilidade urbana.

Vantagens e benefícios

O executivo exibiu dados, números e imagens de linhas de teleféricos em operação em La Paz, na Bolívia, Bogotá e Medellin, na Colômbia, Cidade do México, Koblenz, na Alemanha, Portland, nos Estados Unidos, Londres e Singapura, entre outros, projetados de acordo com as especificidades de cada lugar. Entre as vantagens do modal, ele destacou a baixa ocupação do solo pelo sistema, que consiste em cabines leves transportadas por cabos apoiados em torres de sustentação, com estações distanciadas de 50 a 400 metros entre si, dependendo da topografia e da demanda. A característica de “passar por cima de tudo” permite a criação e utilização dos espaços urbanos abaixo das faixas de domínio das linhas, regulamentadas por instrumentos legais locais. As dimensões reduzidas das estruturas de solo - as estações ocupam em média 300 m² – dispensam a necessidade de desapropriações, ou exigem muito poucas. Ao contrário dos preconceitos e receios do senso comum, Rafael assegura que a tecnologia dos teleféricos é extremamente robusta e segura, e a forma de embarque e desembarque favorece a acessibilidade.

Além disso, o equipamento circula no máximo a 26 km/h, proporcionando ao usuário a oportunidade de contemplar panoramas incríveis; a baixa velocidade é compensada pela ausência de obstáculos ao fluxo como cruzamentos, semáforos, engarrafamentos, acidentes, obras, inundações e outros impedimentos frequentes em transportes de superfície. Essa característica também confere maior previsibilidade ao tempo de deslocamento, facilitando a administração do tempo pelo usuário e evitando atrasos. O especialista ressaltou ainda que o teleférico é um sistema ecológico e sustentável, 100% elétrico, com consumo energético extremamente eficiente – 50 a 100 watts/hora por quilômetro e passageiro transportado e baixíssima emissão de carbono em todo o ciclo de operação. 

Multimodalidade e integração

Rafael Lemos salientou que o crescimento constante das cidades, muitas vezes não planejado, exige a criação de redes de transporte mais inteligentes que se adaptem a esse crescimento. O teleférico, segundo ele, não resolve todos os problemas na maioria das cidades, mas integrado a outros modais pode compor um sistema funcional e atrativo de transporte público. Equipamentos maiores podem transportar até 14 mil passageiros por hora, 7 mil por sentido, resultando em 5000 a 6000 mil carros e 350 ônibus a menos por hora nas ruas. Para ilustrar, ele exibiu gráficos com variáveis de distância percorrida, velocidade e capacidade de volume de passageiros de cada modal. Braulio Lara apontou a importância desses gráficos para dimensionar a combinação ideal de soluções da forma mais inteligente e integrada possível à luz das necessidades e características de cada cidade. No caso de BH, cidade muito espraiada e cheia de desníveis topográficos, o teleférico contribuiria para alimentar os modais troncais, como metrô e BRT, e distribuir os passageiros para e entre os bairros.

O empresário exibiu os diferentes tipos de equipamentos existentes, com as respectivas capacidades, velocidades, distâncias e custos e destacou que o sistema oferece uma grande variedade de soluções construtivas, adequando-se a diferentes usos e situações topográficas e demográficas. Inovações tecnológicas que vêm sendo desenvolvidas possibilitam o transporte de massa em cidades maiores, com maior autonomia, controle e segurança. Em BH, ligações entre espaços e equipamentos urbanos e trajetos interessantes poderiam ser feitos por meio de teleféricos, com grandes benefícios para a mobilidade urbana.

Custos e preços

Questionado pelo vereador Sérgio Fernando (PL) sobre o preço médio para o usuário, Rafael informou que as cidades que oferecem o modal costumam cobrar o valor da tarifa praticada no transporte público local, que varia de 0,5 a 1,2 dólar, conforme a forma de subsídio aplicada – concessões, parcerias público-privadas, etc. Ele lembrou que a implantação do modal exige a construção de infraestrutura própria, diferentemente dos corredores de ônibus, por exemplo, que aproveitam as vias já existentes. O custo, conforme o tipo de sistema adotado, fica em torno de 15 a 25 milhões de dólares por quilômetro. Wesley Moreira (PP), vice-presidente da comissão, confirmou que o teleférico ainda desperta uma certa desconfiança e receio na população. A imagem de veículos e caminhos aéreos, segundo ele, remete aos filmes de ficção futurística e sua visão “assusta, a princípio”. O parlamentar ressaltou a discussão sobre a privatização do metrô e os grandes investimentos públicos para viabilizar a construção da linha 2, que atenderá o Barreiro, e solicitou a opinião do convidado acerca da viabilidade técnica e econômica do modal considerando a geografia e a topografia da cidade. Rafael alegou que não conhece bem os dados, mas apontou que o investimento “extremamente pesado” na construção de metrô só se justifica para transporte de pelo menos 20 mil passageiros por hora, ou 350 mil por dia, e por distâncias maiores - 20, 30 quilômetros, e que a operação só se paga se ele andar carregado. O teleférico, por sua vez, pode ser removido ou mudado de lugar em caso de alterações na demanda.

O diretor executivo do Grupo Doppelmayr/Garaventa afirmou que a implantação de teleféricos, da assinatura do contrato até a entrega, poderia ser concluída num prazo médio de 18 a 24 meses por linha ou série de linhas, a depender do andamento das obras e desapropriações. Outro desafio é superar os preconceitos e receios da administração pública, reforçados por problemas ocorridos nos projetos do Rio de Janeiro em razão de falhas no planejamento e falta de recursos. O projeto, segundo ele, deve ser pensado para dar certo no longo prazo.

O especialista em projetos viários Nelson Timponi ressaltou que, além dos custos e tempo de implantação bem inferiores aos do metrô, o transporte aéreo tem a vantagem de não impactar as estruturas, o espaço urbano e o patrimônio edificado da cidade. Ele lamentou o que ocorreu nas Avenidas Pedro I e Amazonas com a implantação do BRT-Move, que descaracterizou e “matou” espaços e usos tradicionais da cidade. O sistema de teleféricos, em seu entendimento, além de bem mais ajustável e flexível, possibilitaria a retirada dos ônibus das regiões centrais, eliminando congestionamentos, ruídos e poluição, contribuindo para sua requalificação como lugar de moradia, lazer e negócios. A previsibilidade e a redução do tempo de deslocamento, por sua vez, favoreceriam o convívio das famílias e a qualidade de vida dos cidadãos. Transitando em locais como a Serra do Curral e a Pampulha, o modal, para  Nelson Timponi, também favoreceria a preservação histórica, ambiental, o turismo e o lazer na cidade.

Avançar o debate

Braulio Lara acredita que a observação de experiências exitosas e o aprofundamento do debate podem favorecer a adoção do modal em Belo Horizonte. Além da adequação dos teleféricos às características topográficas da cidade, facilitando o deslocamento entre suas diferentes regiões e atendimento das diferentes necessidades da população, ele ressaltou o “efeito escada rolante” do sistema, que funciona de forma contínua, com a chegada de cabines nas estações a cada nove segundos, sem interrupções, reduzindo filas e aglomerações e agilizando sua utilização mesmo em horários de maior demanda. O presidente da comissão manifestou interesse em dar continuidade às conversas, consolidando a possibilidade de incluir o teleférico entre as soluções integradas, complementar os vácuos do sistema de mobilidade atual e melhorar a vida do cidadão.

Superintendência de Comunicação Institucional

6ª Reunião Ordinária da Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços - Reunião com convidados para conhecer estudos, propostas e prováveis soluções para a mobilidade da cidade de Belo Horizonte.