FISCALIZAÇÃO

Falta de clareza na divulgação dos recursos destinados à educação é criticada

Professores cobram valorização do trabalho pela PBH e mais transparência nos dados financeiros. Divergência nas contas foi exposta

quinta-feira, 16 Dezembro, 2021 - 21:45

Foto: Abraão Bruck/CMBH

Falta de clareza nos números referentes à educação municipal esteve entre as principais críticas de representantes dos professores em audiência pública da Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo, nesta quinta-feira (16/12). De acordo com participantes, há discrepância entre os dados divulgados pela Prefeitura relativos aos recursos da educação em diferentes sistemas de informação no que tange ao cumprimento do mínimo constitucional para a área, bem como no que diz respeito aos percentuais gastos com pessoal. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que financia a educação pública, vem recebendo mais recursos em 2021, ao mesmo tempo em que houve redução das dobras de jornada de trabalho dos professores durante a pandemia. Diante desse cenário, profissionais da área querem que o Município aprimore a qualidade da divulgação dos recursos e analise a possibilidade de um abono salarial, que poderia ser concedido por meio de rateio de valores do Fundeb. Requerente da audiência, Macaé Evaristo (PT) irá solicitar à PBH que explique a razão da discrepância entre os números e, ainda, que seja explicitada a metodologia utilizada quando da publicização desses recursos, uma vez que não há clareza. A vereadora também irá requerer informações sobre os impactos que a redução das dobras de jornada trouxe para os gastos na educação. Também será solicitado à Prefeitura que disponibilize pessoal técnico com a expertise necessária para que o Conselho do Fundeb possa compreender, avaliar e fiscalizar os recursos.

“Muito ruim” e “pouco democrática” foram algumas das qualificações que a integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Talita Lacerda, usou para caracterizar a forma como a Prefeitura explicita as contas referentes ao Fundeb e à educação em geral.

Gustavo Machado, representante do Instituto Latino Americano de Estudos Socioeconômicos (Ilaese), também criticou a falta de clareza nos dados financeiros da educação em Belo Horizonte ao citar a discrepância entre informações contidas no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e aquelas que alimentam outro sistema. Segundo ele, pelo FNDE, BH não teria cumprido o dispositivo constitucional que garante 25% da receita resultante de impostos para a educação em 2020, tendo aplicado 24,06% na área no ano passado. Já de acordo com outra base de dados, o Município teria superado o mínimo constitucional em 0,42 ponto percentual.

Além disso, de acordo com Gustavo Machado, 64,34% dos recursos do Fundeb teriam sido gastos, em 2021, com pagamento dos profissionais de educação, quando analisados dados do FNDE; já a partir de outra base de dados, também alimentada pela PBH, os gastos com folha de pagamento na área teriam representado 73,35% dos recursos do Fundeb no mesmo período, o que representa uma diferença de cerca de R$ 90 milhões. De acordo com o especialista, as divergências, que se fazem presentes também em outros anos analisados, demonstra a falta de transparência da PBH na divulgação dos dados referentes aos recursos pertinentes à educação.

O professor e vice-presidente do Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (Cacs-Fundeb), Marcus Vinícius Lindenberg Fróes, demandou que o conselho tenha a seu serviço alguém com a expertise necessária para lidar com relatórios de dados e, assim, permitir o devido controle dos recursos. Ainda segundo ele, os dados disponibilizados pela Prefeitura no que concerne ao Fundeb deveriam ser devidamente tratados para permitir o entendimento dos mesmos por qualquer pessoa interessada. De acordo com o professor, qualquer pessoa deveria ter o direito de estipular um filtro para, por exemplo, saber quanto foi destinado aos professores de cada regional da cidade, contudo, hoje, não é possível fazê-lo, dada a falta de tratamento adequado e de transparência.

Valorização do trabalho

A possibilidade de valorização salarial e de concessão de um abono para os profissionais da educação diante do aumento da inflação, do achatamento da remuneração, da elevação dos recursos destinados ao Fundeb e da diminuição de gastos com pagamento de dobras de jornada foi levantada pelo professor Luiz Bittencourt, que é representante dos trabalhadores em educação no Cacs-Fundeb, conselho responsável por acompanhar e controlar a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos do fundo. Bittencourt explicou que os professores tiveram perdas salariais importantes durante a pandemia e cobrou da Prefeitura um movimento efetivo de valorização dos trabalhadores e trabalhadoras da educação. Ele também demandou mais transparência quanto à disponibilização de dados referentes à utilização dos recursos provenientes do Fundeb para que os professores possam compreender os números explicitados pela PBH. O representante do Cacs-Fundeb solicitou, ainda, a possibilidade de rateio de recursos do Fundo, de modo a assegurar ganhos remuneratórios aos profissionais da educação.

Outros municípios aprovaram projetos de lei assegurando que caso não seja atingido o gasto de, no mínimo, 70% do Fundeb com pagamento de pessoal, o valor não utilizado seja rateado entre os profissionais da área.

De acordo com a professora e representante do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede BH), Vanessa Portugal, o gasto da PBH com folha de pagamento na área da educação vem caindo em termos percentuais nos últimos anos. Segundo a educadora, a participação da receita própria da Prefeitura na folha de pagamento dos trabalhadores da educação diminuiu, o que se reflete, na visão de Vanessa, em desvalorização salarial da categoria. Ela cobrou a valorização do trabalho ao lembrar que, em anos anteriores, a PBH investia montante superior aos 25% determinados pela Constituição em educação. Ainda de acordo com a sindicalista, independentemente de haver ou não sobra de recursos no Fundeb após o pagamento dos profissionais da educação, o orçamento municipal tem condições de garantir a valorização dos trabalhadores da área.

Respostas da Prefeitura

A subsecretária de Planejamento, Orçamento, Gestão e Finanças da Secretaria Municipal de Educação, Natália Araújo, afirmou que apesar de a PBH não violar a exigência de transparência, nem frustrar a lei de acesso à informação, faz-se necessário trabalhar melhor o formato em que os dados referentes aos recursos financeiros da educação são disponibilizados, de modo que eles sejam transformados em informações de fácil compreensão. Ela apontou que são divulgados muitos dados brutos, os quais poderiam ser tratados de modo a garantir informações analíticas sobre receitas e despesas.

Em relação às discrepâncias apontadas sobre os dados disponibilizados no FNDE e em outros sistemas, ela explicou que há metodologias diferentes de cálculo em cada um deles, o que gera tais divergências. De acordo com a subsecretária, em um sistema, por exemplo, os rendimentos financeiros dos recursos do Fundeb são considerados receita e em outro sistema não. Outra diferença apontada diz respeito ao pagamento de recursos atrasados por parte do governo do Estado: em um sistema, recursos referentes a 2018, mas pagos em 2021 são considerados como receita deste ano, porém, em outro sistema, o mesmo recurso não entra como receita de 2021.

Já a respeito da disponibilização de lista nominal com todos os professores que são pagos com recursos do Fundeb, a subsecretária explica que tal relação é apresentada sempre que solicitada pelo sindicato da categoria.

Números da educação

A PBH explicou que só os recursos do Fundeb não são suficientes para arcar com o valor total da folha de pagamentos da educação, sendo necessário o aporte de mais recursos por parte do Município para tal fim. Segundo a subsecretária, em 2020, a folha total da educação foi de R$ 1,2 bilhão, e a receita do Fundeb, incluindo os rendimentos do fundo, foi de R$ 951 milhões, de modo que coube ao Município usar recursos ordinários do Tesouro para arcar com o pagamento integral da folha da educação. Conforme a PBH, em anos anteriores, os recursos do Fundeb também não foram suficientes para arcar com a despesa de pessoal na educação. Ainda segundo a Prefeitura, de janeiro a novembro de 2021, 77,96% dos recursos provenientes do Fundeb foram gastos com o pagamento da folha de pessoal da educação, percentual superior ao mínimo exigido por lei.

A esse respeito, Macaé Evaristo afirmou que a tendência é que, neste ano, o recurso total do Fundeb seja semelhante à despesa do Município com pessoal na área. A parlamentar também apontou que, uma vez que recursos do Fundeb que ficaram retidos em anos anteriores estão sendo pagos em 2021, poderia haver algum tipo de rateio desse montante entre os trabalhadores. A vereadora também cobrou que os dados financeiros da educação sejam disponibilizados em um formato que garanta maior acessibilidade e facilidade de compreensão a todos e que as informações referentes a receitas e despesas sejam atualizadas periodicamente na internet.

Encaminhamentos

Macaé Evaristo apresentou uma série de questionamentos que serão apresentados à PBH na forma de requerimentos da comissão. Para tornar mais acessíveis os dados referentes à receita e despesa da educação, a parlamentar irá solicitar à PBH que explique os motivos da discrepância entre os números relativos ao financiamento da educação publicados em diferentes bases de dados. Também serão solicitadas explicações acerca da divergência nos números relativos ao cumprimento do mínimo constitucional a ser gasto com educação. A vereadora quer que seja explicitada a metodologia utilizada para apuração e cálculo dos recursos financeiros da educação nos diferentes sistemas de informações sobre orçamento, uma vez que não há clareza suficiente para se compreender o que motiva as divergências expostas na audiência. Macaé também irá requerer informações relativas às dobras de jornada de professores e sobre os impactos que a redução das mesmas trouxe para os gastos na educação. Será apresentado, ainda, requerimento à Prefeitura para obter esclarecimentos quanto à relação de trabalhadores que são pagos com recursos provenientes do Fundeb, bem como a respeito dos demais gastos custeados com recursos do fundo. Também será solicitado à PBH que disponibilize pessoal técnico com a expertise necessária para que o Conselho do Fundeb possa compreender, avaliar e fiscalizar os recursos.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater sobre a aplicação dos recursos do FUNDEB - 42ª Reunião Ordinária - Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo