Força tarefa com a PF e denúncia no exterior são sugestões para barrar mineração
Audiência denunciou ineficácia de ações do poder público para coibir atividade da Gute Schit na Serra do Curral
Foto: Karoline Barreto/CMBH
"Há uma atividade ilegal acontecendo lá na Serra do Curral e é papel da Prefeitura fiscalizar e não só isso, mas também impedir a sua realização". A declaração é da vereadora Duda Salabert (PDT) e foi dada na tarde desta terça-feira (26/7) durante audiência pública para denunciar a continuidade da atividade de mineração que vem sendo empreendida pela Gute Schit na Serra do Curral. Na ocasião, a parlamentar cobrou dos governos do Estado e do Município, bem como do Judiciário, providências quanto à suspensão imediata das operações da empresa. No encontro, que contou com a presença de representantes de entidades ambientalistas e de moradores do Taquaril, bairro vizinho à mineração, foram trazidos relatos de descumprimentos da legislação, ameaças a moradores e falta de acesso a documentação pública. Ainda durante a audiência, foram sugeridos o uso de força policial para barrar a mineração e a realização de denúncias da situação da Serra do Curral a países e órgãos estrangeiros. Eduardo Tavares, assessor da secretaria Municipal de Meio Ambiente garantiu que a proteção da Serra não é apenas uma questão da gestão pública, mas de toda Belo Horizonte, e contou que cerca de R$ 3 milhões já se somam nas mais de 40 multas aplicadas pelo Município à empresa. A atividade minerária da Gute Schit opera a partir de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) estabelecido com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad), que foi convidada para o encontro, porém, não enviou representantes. Também chamados para o debate, representantes da empresa não compareceram.
TAC frágil e força tarefa
A Mineração Gute Schit iniciou suas atividades na Serra do Curral sem qualquer rito legal no tocante à questão ambiental, sem as devidas licenças ambientais (prévia, de instalação e de operação) e realizou supressão de vegetação de área de Mata Atlântica sem as devidas autorizações. Após ser autuada pela Semad, firmou um TAC, em novembro de 2021, e atualmente realiza a atividade com base nesse documento.
Segundo o coordenador da ONG Tira o Pé da Minha Serra, Felipe Gomes, que teve acesso ao documento, o TAC estabelecido é frágil e não traz qualquer obrigação ao empreendedor sobre os cuidados mínimos em relação à comunidade do entorno, à fauna e à flora local e à proteção ambiental como um todo. "Como técnico ambiental tenho vergonha, é um TAC vergonhoso e deveria ser cassado imediatamente pela Semad", afirmou.
Ainda de acordo com o ambientalista, que tem feito visitas frequentes ao local, mesmo com as autuações que o Município tem feito, a empresa continua operando na Serra e dezenas de caminhões são avistados todos os dias saindo carregados de material que é levado à área da Fleurs Mineração, localizada em Sabará. Para o ambientalista, frente à falta de ação da Semad e dos órgãos de justiça e às infrutíferas multas aplicadas pela PBH, só resta uma ação coordenada com as polícias. "Isto está acontecendo há 7 Km da Praça Sete. Tivemos informação de que a Semad esteve lá no último dia 23, mas hoje pela manhã caminhões continuavam saindo. A Prefeitura precisa chamar o Ministério Público, a Polícia Federal e Civil para montar uma força tarefa para impedir a ilegalidade", ressaltou.
A proposta da força tarefa também foi defendida por Maria Teresa Corijo (Teca), do Instituto Cordilheira, que acredita que denúncias a orgãos inernacionais sobre o que vem ocorrendo no estado também devem ser feitas. Para a ambientalista o que está acontecendo na região da Serra do Curral é o mesmo que já ocorre na cidade de Congonhas (MG), que são as instalações do que ela chama de 'mini minas', onde pequenos empreendimentos minerários atuam trabalhando para grandes mineradoras. "A área que a Gute está minerando é da Tamisa e isso precisa ser investigado, porque nenhuma mineradora iria deixar uma outra empresa atuar na sua área . Na Agência Nacional de Mineração não é possível consultar diversos documentos relativos à Gute, e o último lançamento é recente, do dia 15 de julho, mas não é possível conhecer o teor", afirmou a ambientalista que lembrou que ainda que o discurso do poder público é de que toda reparação ambiental pelas tragédias já ocorridas vêm sendo feitas.
Casas condenadas, ameaças e solo frágil
Nilo Sampaio é morador do Taquaril, nas proximidades da área que vem sendo minerada e conta que a comunidade tem sofrido com a ação da Gute Schit na região. Segundo Nilo, além da poeira e do barulho do trânsito de caminhões, as moradias vêm sofrendo com as dinamitações que já ocorrem há mais de um ano. "Temos já 36 casas condenadas e autuadas pela PBH para serem demolidas. Em doze delas têm gente morando e até agora não disseram o que farão com os moradores; o que vai ser da comunidade Taquaril", questionou Nilo, que contou ainda que os moradores são ameaçados quando gravam vídeos ou tiram fotos.
Viver praticamente dentro da mineração tem tirado o sono também da líder comunitária Ednéia de Souza que há mais de 20 anos mora na região. Segundo a moradora, o Taquaril já tem um histórico de solo fragilizado e, ainda assim, foi, na década de 1980, a área escolhida pelo governo do estado para assentar famílias do movimento de luta por moradia. "Eles cederam aquela região para nós. Na época eram cerca de 8 mil pessoas e o Estado entregou 280 moradias. O restante, então, foi todo ocupado e nada foi regularizado. Foram construídas casas onde nem uma cabra para em pé", contou a moradora que acredita que uma tragédia poderá ocorrer, pois existem moradias que estão em locais onde a declividade é de 60 graus.
Multas e reversão do dano ambiental
Para a vereadora Duda Salabert, que fez o pedido de audiência, embora a PBH venha notificando a empresa, é preciso mesmo uma ação mais enérgica do Poder Executivo, pois os valores das multas acabam sendo inferiores ao que a empresa lucra, descumprindo a legislação vigente. "Fizemos convite formal à Urbel e à Guarda Municipal, e não tivemos retorno. Se eu fosse prefeita, a primeira coisa que faria é colocar a Guarda Municipal, e não sairia nenhum caminhão de lá. Colocaria guardas lá dentro e não iria explodir nenhuma dinamite lá", afirmou.
Segundo Eduardo Tavares, assessor da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, a PBH vem agindo e 44 autos de infração, um de intervenção e embargo da mineradora já foram feitos pela Prefeitura, somando mais de R$ 3 milhões em multas. Para Tavares, a depender da agilidade em suspender a atividade, o dano que a empresa vem causando à Serra poderá ser parcialmente revertido num prazo de 20 a 30 anos, porém a vegetação natural não será a mesma. "Não estamos inertes, estamos agindo, e a preservação da Serra do Curral não é uma questão de gestão é uma questão de Belo Horizonte. Isso é recuperável; é possível tornar o local um lugar agradável. O Parque das Mangabeiras é um exemplo de recuperação, porque ali era uma mineração. Vai depender da agilidade das nossas ações", afirmou acrescentando que a PBH vem atuando dentro dos limites legais e que ultrapassar essa legalidade poder tornar o Município alvo de ações de improbidade.
Para a vereadora Bella Gonçalves (Psol), que também participou da audiência, a ação da mineradora na Serra do Curral deveria causar vergonha aos órgãos do poder público. Bella conta que, desde 2019, acompanha a Ocupação Terra Nossa, localizada na região. Ela explica que denúncia de falta de acesso à água pelos moradores foi feita ao Ministério Público, porém o Tribunal de Justiça negou o direito às famílias, mesmo a empresa esbanjando água para minerar no local. A parlamentar também sugeriu que nova audiência seja feita pela Comissão de Direitos Humanos e que se cobre da Urbel a colocação de técnicos em campo para verificar os impactos que a mineração está causando às moradias da ocupação.
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