ACORDO DA VALE

Traçado final do Rodoanel ainda não está definido, afirmam órgãos estaduais

Entidades, comunidades e movimentos sociais questionam supostos benefícios da obra diante dos custos ambientais e humanos

quarta-feira, 21 Julho, 2021 - 11:15
Monitor de computador exibe vereadores em videoconferência. Ao fundo, cadeiras vazias do Plenário Helvécio Arantes

Foto: Karoline Barreto/CMBH

Os possíveis danos ambientais e sociais que resultariam da construção do novo Rodoanel, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), foram expostos e debatidos nesta terça-feira (20/7), em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana. A obra deve ser financiada pela mineradora Vale S/A, como parte do acordo com o governo do Estado para compensação dos estragos causados pelo rompimento da barragem da Mina do Feijão, em Brumadinho, e, segundo opositores do projeto, a via afetará áreas de preservação e comunidades do entorno. As Secretarias de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra), o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e o Ministério Público Federal garantiram que os estudos de impacto ambiental e a definição do traçado serão orientados e acompanhados pelos órgãos.

Requerentes da audiência, Bella Gonçalves (Psol) e Iza Lourença (Psol) citaram as principais preocupações de entidades ambientais e movimentos sociais que questionam a implantação do Rodoanel e consideraram que a avaliação e a discussão dos impactos ficam mais urgentes diante da iminência da obra. Os representantes da Comissão Pastoral da Terra, Frei Gilvander Moreira; do Gabinete de Crise da Sociedade Civil, Gustavo Gazinelli; do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Rogério Tavares; e do  Greenpeace-BH, Mariana Faria, apontaram as ameaças ao patrimônio ambiental, hídrico, arqueológico, histórico e cultural da região e as consequências sociais da remoção e descaracterização de diversas comunidades.

As entidades e movimentos também criticaram a aprovação do acordo sem o devido diálogo com a sociedade e questionaram a real necessidade da construção do Rodoanel, que, em seu entendimento, repete o erro histórico de priorizar o modelo rodoviário/automobilístico e a mercantilização do transporte e da mobilidade, colocando o lucro acima das necessidades humanas. Nessa perspectiva, foi apontado que a cobrança de pedágio pela concessionária vai onerar o deslocamento diário dos moradores da região, muitos pertencentes a classes mais baixas, e que a busca de vias alternativas pode sobrecarregar o trânsito nos bairros do entorno.

Mineradora Vale seria beneficiada

Outra objeção apresentada pelas entidades é que a mineradora Vale - responsável pelo crime social e ambiental que resultou em centenas de mortes, destruição de famílias, ecossistemas e cursos d'água - vai ser uma das principais beneficiadas pelo Rodoanel, que reduzirá os custos de transporte de minério, compensando os gastos com a obra. Para eles, esses recursos deviam ser destinados a ações de interesse das populações afetadas e recuperação ambiental. Cristina Oliveira, do SOS Várzea das Flores, lembrou que a capital é abstecida por mananciais situados em outros municípios, como os da Área de Proteção Ambiental (APA) Várzea das Flores, em Contagem, e sua proteção deve ser incluída na agenda da Prefeitura e da Câmara de BH.

Melhorias no Anel Rodoviário

Núbia Ribeiro, da Comunidade de Moradores em Áreas de Risco (CMAR) e Michelle Reis, das  Brigadas Populares, também contestaram um dos principais argumentos a favor do Rodoanel, que reduziria o trânsito de carretas e caminhões e os acidentes no atual Anel Rodoviário. Criticando a omissão da concessionária Via 040, que está devolvendo o trecho ao Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit) para não arcar com as obras e desapropriações, elas afirmam que o Rodoanel não eliminará a necessidade de intervenções, especialmente nos “gargalos” (pontos de estreitamento) do Anel. As cerca de 12 mil famílias que moram nas margens e enfrentam os problemas cotidianamente querem ser removidas, mas a falta de moradias em BH as obriga a procurar imóveis em outros municípios.

Traçado não está definido

As representantes da Semad, Ana Motta, e da Seinfra, Lidiane Campos, esclareceram que as duas secretarias estão trabalhando de forma alinhada para garantir que o processo de licitação e elaboração do projeto ocorram dentro das diretivas de preservação ambiental. As gestoras relataram a realização de reuniões, levantamentos, visitas técnicas, consultas públicas e estudos prévios para subsidiar o processo licitatório, mas a definição final do traçado - que por enquanto é um pré-projeto (foto) - e o estudo de impacto ambiental (EIA-RIMA) serão feitos pela empresa vencedora, com acompanhamento e orientação permanente do Estado, considerando as questões discutidas. A Seinfre relacionou os benefícios da construção do Rodoanel, como aumento da produtividade da RMBH, da arrecadação de ISS, crescimento do PIB e geração de empregos.

Antônio Malard, do Instituto Estadual de Florestas (IEF), informou que a entidade atua alinhada à Semad e dialoga com outras partes envolvidas, realiza vistorias e estudos técnicos para orientar o órgão. Decisões que afetam áreas de preservação, segundo ele, exigem estudos específicos e obtenção do aval dos conselhos consultores. Sobre o Rodoanel, o IEF aguarda a definição do projeto e a abertura do processo de licenciamento para emitir parecer formal. O procurador Bruno Ferreira da Silva relatou que o Ministério Público participou da elaboração do acordo, que visa à reativação socioeconômica da região. Segundo ele, no que depender do MP, a obra não será licenciada enquanto as questões ambientais e sociais não forem sanadas.

Encaminhamentos

Bella Gonçalves e Iza Lourença vão requerer o envio de pedidos de informação formais ao governo do Estado sobre a ausência de estudos de impacto anteriores ao processo licitatório e à definição do traçado em pré-projeto. Também querem saber os impactos previstos na mobilidade da RMBH pela implantação do Rodoanel. Será solicitado, ainda, o acesso da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana às Notas Técnicas do IEF sobre áreas protegidas. Se necessário, serão promovidas outras audiências para abordagem específica de cada uma das dimensões da questão.

Assista ao vídeo da reunião na íntegra.

Superintendência de Comunicação Institucional

Audiência pública para debater os impactos socioambientais das obras do Rodoanel- 23ª Reunião Ordinária : Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana