SEM CASA

Comissão discute políticas para população em situação de rua

Alto número de homicídios de moradores em situação de rua motiva discussão

quinta-feira, 22 Agosto, 2013 - 00:00
Comissão de Direitos Humanos

Comissão de Direitos Humanos

Em Belo Horizonte, vinte moradores em situação de rua foram mortos de janeiro a julho de 2013. Em todo o ano passado, 52 desabrigados foram vítimas letais na capital. Preocupados com os números da violência contra esta população, a Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor realizou nesta quinta-feira (22/8) uma audiência pública para discutir com a sociedade civil e o poder público as principais causas do problema, bem como a elaboração e implementação de políticas públicas para o setor.

Os vereadores Adriano Ventura (PT) e Pedro Patrus (PT), requerentes da audiência em conjunto com o vereador Arnaldo Godoy (PT), cobraram mais investimento da Prefeitura em políticas públicas para este segmento da população. Patrus criticou o fato de a Prefeitura não acatar as emendas ao orçamento municipal “construídas juntamente com os movimentos sociais para ampliar os serviços prestados pelo poder público aos moradores em situação de rua.”

Os parlamentares também cobraram a realização de um novo censo da população em situação de rua, uma vez que a última pesquisa do gênero na capital data de 2005. Na ocasião, a população adulta em situação de rua em Belo Horizonte era de, aproximadamente, 916 indivíduos. Somada às crianças e adolescentes que estavam sob sua responsabilidade, o número total chegava a 1.164 pessoas. O objetivo é que os dados obtidos com a pesquisa orientem a elaboração e implementação de políticas públicas direcionadas a esta população, uma vez que a coleta de dados em censos demográficos é de base domiciliar e, portanto, não fornece informações sobre os desabrigados.

Outra cobrança dos parlamentares diz respeito à ampliação e capacitação das equipes responsáveis pela abordagem social. Ventura, que é professor e pesquisador na área de Comunicação Social, também salientou a falta de campanhas midiáticas para conscientizar os belorizontinos contra a violência e o preconceito aos moradores de rua. Como exemplo da capacidade de tais iniciativas em promover novos valores e atitudes na população em geral, ele citou a campanha em defesa dos direitos dos pedestres que, segundo ele, tem diminuído os acidentes de trânsito em Belo Horizonte.

Demandas sociais

De acordo com o Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Material Reciclável, a violência contra este segmento social é proporcionalmente maior do que aquela sofrida pelo restante da população. A representante do Centro também chamou atenção para a violência institucional praticada pelo Estado. De acordo com ela, quando a violência vem do agente público, a vítima, muitas vezes, fica impossibilitada de fazer uso de serviços como abrigos e delegacias. Ela também cobrou a apuração minuciosa dos casos de violência pela Polícia Civil.

A Prefeitura também foi questionada quanto ao cumprimento da liminar judicial que proíbe o recolhimento dos pertences pessoais dos moradores em situação de rua.

A Promotora de Justiça Claudia Amaral, que atua na área de direitos humanos, explicou que a cidade vive um conflito de interesses entre moradores de rua e a comunidade em geral. Segundo ela, isso aumenta com a ausência do serviço de abordagem social da Prefeitura. No entanto, a indignação dos belorizontinos contra os moradores de rua, segundo a promotora, deveria ser direcionada ao poder público, que não tem orçamento suficiente e não oferece os serviços necessários para atender à população desabrigada.

Participação por direitos

A ex-moradora de rua Anita dos Santos, que atualmente é uma das lideranças dos movimentos em prol da população em situação de rua, reivindicou a ampliação das bolsas-moradias oferecidas pelo poder público e o pleno acesso a direitos fundamentais. Anita destacou, ainda, que, recentemente, as pessoas com trajetória de rua têm se organizado e tido uma participação mais ativa na elaboração das políticas públicas que lhes dizem respeito.

Claudenice Rodrigues Lopes, da Pastoral de Rua de Belo Horizonte, também salientou que a população de rua vem se qualificando para tomar assento nos espaços decisórios como os conselhos de políticas públicas. Este é o caso de Walter Agostinho da Silva, que já esteve desabrigado e atualmente é membro do Conselho Municipal de Saúde. O representante do conselho na audiência criticou a falta de verbas para a construção de equipamentos públicos destinados a receber pacientes que não têm condições de voltar para as ruas após a alta hospitalar. Ele também destacou que a falta de cuidados médicos adequados tem causado o aumento dos casos de tuberculose nesta população.

Ações da Prefeitura

Sobre o recolhimento de pertences pessoais, a representante da Prefeitura Soraya Romina Santos informou que o Executivo Municipal está elaborando uma instrução normativa para regular a ação dos agentes públicos junto aos moradores de rua, orientando-os para adotarem uma abordagem social. De acordo com ela, todos os servidores da Prefeitura que atuam em contato direto com o segmento terão acesso ao documento.

Ela também destacou que será inaugurada em breve uma república para moradores em situação de rua na região Oeste da capital, com recursos do Orçamento Participativo. Segundo ela, no entanto, a entrega do novo equipamento está sendo questionada pela comunidade local, que não quer ser vizinha da república. A respeito da relação da população em geral com os moradores de rua, ela destacou que, ao mesmo tempo em que a ouvidoria da Prefeitura recebe, em média, cinco contatos por semana com reclamações sobre moradores de rua, a população se nega a cooperar com as possíveis soluções, recusando-se a receber equipamentos que atendam as pessoas em situação de rua.

Com relação aos cuidados com aqueles que recebem alta hospitalar, mas não têm para onde ir, a Prefeitura informou que estão sendo criadas vinte vagas para receber pessoas especificamente nesta situação.

Atuação da polícia

De acordo com o delegado da Polícia Civil Marcelo Carvalho Ferreira, “grande parte da violência sofrida pelos moradores de rua é produzida entre eles”. Segundo o delegado, o uso de pedras e facas em assassinatos e em tentativas de homicídio seria um indício desse fato.

O delegado também informou que é comum os moradores em situação de rua atrapalharem as investigações ao fornecerem nomes falsos ou ao não recorrerem à polícia por serem procurados pela justiça.

Encaminhamentos

Ao final da reunião, os vereadores Pedro Patrus e Adriano Ventura informaram que irão encaminhar à Prefeitura ofícios cobrando respostas sobre as políticas públicas para os moradores em situação de rua. Eles querem saber por que as emendas orçamentárias que beneficiam este segmento não foram acatadas pelo Executivo. A Prefeitura também será questionada sobre qual a previsão orçamentária para atendar a esta população.

Outra solicitação a ser encaminhada ao Executivo diz respeito à ampliação da discussão sobre o conteúdo da Instrução Normativa que será publicada pela Prefeitura e que deverá orientar a ação dos agentes públicos municipais que atuam junto aos moradores de rua.

A Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor também deverá encaminhar à Polícia Civil um ofício solicitando informações sobre os inquéritos que investigam a violência contra a população de rua na capital.

Superintendência de Comunicação Institucional