LONGE DO CONSENSO

Questões de gênero dominam audiência sobre plano de educação

Militantes da causa LGBT, grupos religiosos e de defesa da “família” se provocaram, vaiaram e trocaram ofensas durante audiência pública nesta quinta (24/9) para debater diretrizes e metas constantes do Plano Municipal de Educação, encaminhado à Câmara pelo Executivo. Professores e vereadores lamentaram a distorção do foco do debate e a perda da oportunidade de abordar aspectos como a valorização da carreira e as destinações orçamentárias para o setor.

quinta-feira, 24 Setembro, 2015 - 00:00
Debate sobre Plano Municipal de Educação gerou debates acalorados sobre questões de gênero (Foto: Bernardo Dias)

Debate sobre Plano Municipal de Educação gerou debates acalorados sobre questões de gênero (Foto: Bernardo Dias)

Militantes da causa LGBT, grupos religiosos e de defesa da “família” se provocaram, vaiaram e trocaram ofensas durante audiência pública promovida pela Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo nesta quinta-feira (24/9) para debater as diretrizes e metas constantes do Plano Municipal de Educação (PME), encaminhado à Câmara pelo Executivo. Professores e vereadores lamentaram a distorção do foco do debate e a perda da oportunidade de abordar aspectos como a valorização da carreira e as destinações orçamentárias para o setor. O presidente da comissão convocou os grupos e cidadãos a formalizarem suas propostas e sugestões junto aos vereadores, já que o texto ainda poderá receber emendas.

As desavenças ocorridas durante o evento tiveram início quando o presidente da comissão, Professor Wendel (PSB), convidou para compor a Mesa, juntamente com os representantes da prefeitura e do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal (Sindirede-BH), integrantes dos movimentos como Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz, Associação dos Pastores Evangélicos, Associação Pró-vida e Pró-família, Rede Cidadã de Pais de Família e da paróquia São Gabriel, contrários à inclusão da “ideologia de gênero” no PME . Diante dos protestos de outros participantes, o vereador chamou militantes e defensores da causa LGBT para que também tomassem assentos.

Segundo o vereador Arnaldo Godoy (PT), coautor do requerimento juntamente com Pelé do Vôlei (PTdoB) e Coronel Piccinini (PSB), as pessoas convidadas por Wendel, que em audiências anteriores da Comissão de Direitos Humanos defenderam  fervorosamente a exclusão do tema da educação pública, não constavam na lista de convidados aprovada pela comissão. Assegurando que a retomada dessa discussão não foi proposital, mas sim trazida espontaneamente pelos participantes, o vereador reafirmou seu posicionamento contrário à introdução de questões de gênero no PME e defendeu o direito de manifestação de todos os cidadãos e movimentos ali presentes.

Os vereadores Sérgio Fernando Pinho Tavares (PV) e Adriano Ventura (PT) também se posicionaram em defesa da família, a quem caberia a formação moral e sexual das crianças em conformidade com suas crenças e valores, e repudiaram a introdução do tema nas escolas, especialmente as de educação infantil, já que as crianças não estariam devidamente preparadas para a abordagem de questões referentes à sexualidade e à identidade de gênero, inapropriadas para a faixa etária. Contestando Godoy e o companheiro de bancada Pedro Patrus (PT), que asseguraram a ausência de diretrizes referentes à ideologia ou identidade de gênero no PME, os parlamentares reforçaram a preocupação dos grupos religiosos, apontando a existência de “brechas” no texto para a inclusão de dispositivos sobre o assunto.

Reforçando o coro do movimento LGBT, Godoy e Patrus repudiaram a intromissão de grupos religiosos em discussões dos temas políticos na Casa, violando cláusula constitucional que estabelece a laicidade do Estado e garante a igualdade de direitos e o acolhimento do poder público às demandas e interesses de todos os cidadãos, independente de cor, classe social, idade, crença ou orientação sexual, dando atenção especial aos excluídos. No Plenário e galerias, faixas e cartazes contra e a favor do debate, gritos e palavras de ordem, provocações e tumultos deram o tom da reunião, que chegou a ser suspensa para que os ânimos se acalmassem.

“Oportunidade perdida”

Representando as Secretarias Municipais de Governo e de Educação, o gerente de Educação Básica e Inclusão desta última, César Eduardo de Moura, fez uma rápida explanação sobre o projeto de lei, que tramita em 1º turno na Casa na forma do PL 1700/15. Segundo ele, a inclusão e o respeito à diversidade integram as diretrizes do município, sem desrespeitar a supremacia da família na formação moral e educação dos filhos. Reforçando testemunhos de professores e de vítimas do preconceito, a defensora pública de Direitos Humanos Júnia Ronan e a advogada Raquel Diniz, do Comitê de Diversidade Sexual da OAB, relataram as dificuldades enfrentadas por essas pessoas, vítimas de discriminação dentro da própria família, além de abandono e lares desestruturados, o que determina a revisão do conceito tradicional de “família”, que não corresponde mais à realidade de muitas crianças.

Muitas pessoas se manifestaram contra e a favor da abordagem do assunto nos planos nacional e municipal de educação, nos quais serão estabelecidas metas e diretrizes para os próximos dez anos. Militantes pró e contra a inclusão de questões de gênero no âmbito das escolas e de movimentos LGBT defenderam suas posições, apresentaram histórias de vida e experiências. De outro lado, professores e servidores da rede municipal de educação também ocuparam o microfone na tentativa de chamar a atenção dos participantes para diversas questões importantes sobre o PME que estariam sendo deixadas de lado, perdendo-se uma grande oportunidade de serem debatidas pela Comissão de Educação.

Entre essas, foram mencionadas a valorização da carreira e da remuneração dos professores, equiparação salarial, democratização da gestão e das eleições nos conselhos, terceirização de atividades-fim nas Unidades de Educação Infantil, com a substituição de professoras por pessoas sem qualificação, violência e agressões em sala de aula. O diretor do Sindirede-BH, Wanderson Rocha, queixou-se da omissão dos vereadores e demais participantes em relação às recentes mobilizações da categoria, que se prepara para entrar em greve a partir do próximo dia 30/9. Outros docentes se queixaram da pouca representatividade das conferências que antecederam a elaboração do PME e a ausência, no texto, das metas acordadas na ocasião, além da não observância de diretrizes previstas no plano nacional.

Apresentação de propostas

Professor Wendel explicou a tramitação do projeto, que será apreciado em dois turnos nas comissões e no Plenário, possibilitando a apresentação de emendas por parte dos vereadores. Destacando a importância da participação popular e a função dos membros do Legislativo de representar o eleitor, ele conclamou os participantes, bem como qualquer cidadão ou grupo, que apresentem formalmente, por escrito, suas propostas e sugestões, formalizando-as junto à Comissão de Educação e aos vereadores mais alinhados com suas ideias e demandas.

Garantindo que todas as sugestões e propostas serão analisadas pelos parlamentares, ele defendeu o diálogo entre as partes e a construção conjunta do Plano Municipal de Educação, configurando a condução democrática dos assuntos da cidade.

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Superintendência de Comunicação Institucional