DIREITOS HUMANOS

Parlamentares e ativistas discutiram violência contra jovens negros

Segundo dados da Anistia Internacional, o Brasil é um dos países onde mais se mata no mundo. Só em 2012, dos cerca de 56 mil homicídios registrados, mais da metade vitimou jovens na faixa dos 15 aos 29 anos. Desses, 77% são negros. Para discutir o problema e propor alternativas, a Câmara de BH realizou audiência pública nesta segunda-feira (27/4). O debate conduziu à proposta de criação de uma comissão especial para tratar do assunto no parlamento municipal.

segunda-feira, 27 Abril, 2015 - 00:00
Segundo a Anistia Internacional, 77% dos jovens assassinados no Brasil são negros. (Foto: Mila Milowski)

Segundo a Anistia Internacional, 77% dos jovens assassinados no Brasil são negros. (Foto: Mila Milowski)

Segundo dados da Anistia Internacional, o Brasil é um dos países onde mais se mata no mundo. Só em 2012, dos cerca de 56 mil homicídios registrados, mais da metade vitimou jovens na faixa dos 15 aos 29 anos. Desses, 77% são negros. Para discutir o problema e propor alternativas para o enfrentamento do genocídio das juventudes negras, a Câmara de BH realizou audiência pública nesta segunda-feira (27/4). Requerida pelo vereador Arnaldo Godoy (PT) e promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor, a reunião contou com forte participação de movimentos sociais, cujos representantes lotaram o Plenário Juscelino Kubitschek. O debate a respeito da violência contra jovens negros conduziu à proposta de criação de uma comissão especial, na Câmara de BH, para debater o tema, além da defesa de articulação de esforços para assegurar que a sociedade civil e o poder público, em diferentes esferas, atuem em rede no combate à violação de direitos juvenis.

Representando o Fórum das Juventudes da Grande BH, a estudante Miriam Alves lembrou que mais de cem anos após a Lei Áurea, as marcas do regime escravocrata ainda continuam visíveis no país. Elas se expressam, segundo a ativista, na desigualdade de oportunidades e na falta de acesso a direitos básicos por parte da população negra. Se fazem sentir, também, na violência institucional dirigida a esses cidadãos, que segundo Miriam, não encontram o devido acolhimento no âmbito das políticas de direitos humanos, embora sejam os alvos preferenciais das políticas de segurança pública.

Em tom de manifesto, a intervenção do Fórum das Juventudes chamou atenção para a necessidade de se reconhecer que o Brasil ainda é um país racista e que a discriminação se expressa, também, nas ações do próprio Estado, já que muitas vezes, o extermínio da juventude resultaria de desastrosas ações policiais. Nessa perspectiva, para fazer frente ao morticínio das juventudes negras, Miriam Alves defendeu o fortalecimento das ações afirmativas, o remodelamento de políticas de segurança e combate às drogas, bem como o respeito aos preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Para o vereador Arnaldo Godoy, a firme participação dos movimentos sociais na audiência mostrou o repúdio desses atores à violência dirigida contra as juventudes negras. Ainda de acordo com o parlamentar, o poder público não pode transigir com essas violações, sob pena de manter intocadas manchas históricas, que remontam ao tempo da escravidão.

Reflexos do racismo

Para Felipe Freitas, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do governo federal, o racismo está de tal modo entranhado na sociedade brasileira que parcelas da sociedade chegam a perceber de forma hierarquizada o valor da vida. Nesse sentido, afirma, é comum que a morte de um jovem negro seja percebida como menos importante do que a dos jovens brancos. Diante disso, ele aponta a necessidade de transformar o imaginário social, de modo a desnaturalizar o extermínio da população negra, fazendo com que ele não seja tratado como algo corriqueiro ou como um simples traço do cotidiano das grandes cidades.

Nila Barbosa, da Secretaria Municipal de Políticas Sociais, lembrou que, em Belo Horizonte, mais de 50% da população se autodeclara negra ou parda. Segundo ela, para garantir que essa parcela da população tenha melhor acesso a seus direitos, a Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial do Município trabalha de forma articulada com outras pastas, como a de educação e saúde, no sentido de orientar ações intersetoriais com vistas à promover a superação de desigualdades. Para subsidiar e fortalcer as políticas em curso no município, ela propôs a criação de um grupo com representação do poder público e da sociedade civil, voltado à proposição de ações concretas para o combate à violência contra a população negra. Perspectiva semelhante foi defendida pelo deputado federal Reginaldo Lopes (PT), que preside, na Câmara de Deputados, Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a violência contra jovens negros e pobres.

Comissão Especial

Como encaminhamento da audiência, os vereadores Arnaldo Godoy, Pedro Patrus (PT) e Gilson Reis (PCdoB) anunciaram que vão propor a criação, na Câmara de BH, de uma comissão especial para debater o tema. O objetivo é que, em articulação com movimentos sociais, o colegiado discuta os reflexos da violência contra a juventude negra em Belo Horizonte, no intuito de elaborar, em conjunto com a sociedade civil, propostas para o combate do problema. De acordo com Godoy, a expectativa é que a comissão especial atue em parceria com outras representações do poder público, como Secretaria de Estado Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, além do governo federal e de autoridades locais.

Acordos para atuação em rede também foram construídos durante a reunião. A proposta é trabalhar para garantir um melhor compartilhamento das agendas dos diversos movimentos de luta contra o genocídio da população negra, de modo a criar canais mais qualificados de interlocução entre poder público e a sociedade civil, tanto em nível federal quanto estadual e municipal.

Veja o vídeo completo da reunião.

Superintendência de Comunicação Institucional